11/05/2017

As folhas (Conto), de Humberto de Campos


As folhas

Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)

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Lançados para longe da pátria pelos movimentos revolucionários que estalaram depois da guerra, o conde Ricardo e o príncipe Romualdo conversavam, displicentes, naquele começo de verão oriental, à sombra do grande plátano do parque do hotel, trocando ideias e fazendo comentários discretos sobre a situação política dos países em que haviam reinado. Estirados nas suas cadeiras de viagem, mostravam, ambos, um profundo desinteresse pelas coisas vulgares do mundo. E era por isso que, de vez em quando, mergulhavam em silêncio profundo, quedando a acompanhar com os olhos, melancólicos e soturnos, as oscilações da fumaça clara que atiravam, preguiçosos, para o ar.

O dia estava morno, quieto, parado, anunciando para a noite uma nova tempestade do Deserto. E era nisso que pensavam os dois fidalgos ilustres, despojos elegantes de dois tronos desmoronados, quando o príncipe começou a seguir com os olhos, uma a uma, as folhas amarelas que se desprendiam da árvore, e que se vinham espalhar no chão, estendendo pelo solo um crespo tapete de topázio. De repente, lançando para o espaço uma nuvem de fumaça cheirosa, o príncipe observou, alisando a barba negra e cerrada:

— Como os homens se assemelham às árvores!...

O conde Ricardo fechou o livro que principiara a ler, e, erguendo para a fronde os seus olhos muito azuis e muito doces, esperou a explicação do companheiro.

E o príncipe continuou:

— Enquanto a árvore está verde, e tem seiva, nenhuma folha o abandona, senão arrancada à força. Venha, porém, o verão, e, com ele, a falta de seiva, a decadência da planta, e nenhuma quer ficar mais presa ao ramo!

Compreendendo o símbolo, o conde acentuou, sacudindo, triste, a cabeça leonina:

— São como os amigos...

E o príncipe confirmou:

— São como os amigos...

No silêncio do dia, as folhas, uma a uma, continuavam a cair...

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