
26 de agost Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Um dos encantos da alta sociedade
carioca são as senhoras que cultivam, nos salões e na intimidade, os deliciosos
cogumelos da "gafe". Educadas, finas, inteligentes, essas figuras da
"elite" constituem, geralmente, legítimos ornamentos da família
brasileira; há, porém, no Inferno uma classe de demônios irreverentes que se
divertem zombando das mulheres lindas, e o resultado são esses deliciosos
delíquios do espírito, e o desgosto que se apossa, depois, das pobres vítimas
dessa maliciosa brincadeira diabólica.
À frente desse exército de
"gafeuses" marcha, com as "gafes" que tem cometido na
terra, a jovem senhora Cardoso Nunes, esposa do Dr. Abelardo Nunes, conhecido
corretor e capitalista. Formosa e gentil; D. Clotilde é incapaz de uma
perfídia, de uma insinuação malévola, de uma perversidade punidora. As amigas
estimam-na profundamente e só não fazem o mesmo as inimigas, porque D. Clotilde,
com franqueza, não as tem. A sua simplicidade destrói todas as prevenções, e de
modo tal que os seus íntimos lhe perdoam as "gafes", mesmo quando se
trata de casos duvidosos, como o de anteontem.
A roda de convidados era enorme e
seleta, no grande terraço dando para o mar, predominando, nela, o número de
figuras femininas. Palestrava-se vivamente sobre o nervosismo de certas
senhoras, algumas das quais nutrem uma aversão às baratas, às rãs, aos grilos e
a outros pequenos seres repugnantes.
— Eu tenho horror é ao caramujo!
— informava Me. Costa Meireles, com a papada a repousar, como a do Chaby, sobre
o peito volumoso. — Quando eu vejo um caramujo, fico toda arrepiada!
E, fechando as mãos muito
redondas, muito gordas, fez estremecer, toda, dos pés à cabeça, a formidável
montanha de toucinho.
— Pois, eu não, — atalhou Mlle.
Pinheiro César; — o que me horroriza é o percevejo. Quem me quiser ouvir
gritar, é por um percevejo no meu caminho!
Foi por essa altura que D.
Romualda Brito, a ilustre senhora tão conhecida pelas suas leviandades
galantes, interveio, informando:
— Pois, eu, não tenho medo de
nada disso. Nenhum desses bichinhos me faz, como a vocês, qualquer mal aos
nervos.
E contou:
— Imaginem que, outro dia, eu
estava em pé na sala de espera do cinema de Copacabana, quando senti, de
repente, uma coisa subindo pela minha perna!
— Meu Deus! — gemeu Madame Cunha
Andrade, mostrando o braço arrepiado. — Olhem como eu estou!
E a outra continuou:
— Sem me mover, eu compreendi que
era um rato!
— Que horror! — gritaram as
outras senhoras.
— Quieta estava, quieta fiquei. O
rato subiu, primeiro, para meu sapato. Depois, passou à meia. E assim,
subiu-me, aos poucos, pela perna!
As senhoras, em silêncio,
mostravam-se horrorizadas com o acontecido. E foi no meio dessa impressão, que
D. Clotilde interveio, muito séria:
— O rato subiu, mesmo, pela perna
da senhora?
— Subiu, menina!
E D. Clotilde, logo, com a maior
ingenuidade do mundo:
— Mas desceu, depois; não desceu?
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