11/26/2017

Hóspede ilustre (Conto), de Lima Barreto


Hóspede ilustre
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)

 "Hóspede ilustre" (Conto), de Lima Barreto
Todos os dias, anunciam as folhas a chegada de um hóspede ilustre, estampando-lhe algumas vezes o retrato. O Rio de Janeiro, se não está ficando o Instituto de França ou a Roy al Society de Londres, pode bem ficar sendo o Museu do Trocadero.

Não me canso de ler tais notícias e causa-me assombro que semelhantes sumidades não figurem no Larousse e em outras publicações congêneres.

Não vem isto, porém, ao caso. O que estas linhas tencionam é protestar contra a omissão que eles fizeram, do nome do ilustre marroquino Mulay Málek ben-Bélek.

Ele vem superintender a construção do pavilhão de Marrocos, que será erguido no estilo original daquele próspero império.

Os materiais empregados, como se sabe, são caniços e uma argamassa feita de bosta de camelo e lã de carneiro. Como aqui não havia camelos, portanto, o primeiro elemento da aludida argamassa, o imperador de Marrocos fretou um barco suíço e atestou-o daquele primordial elemento dos Partenons dos seus domínios. Vai ser uma lindeza, debaixo da feérie iluminativa que o Sr. Carlos Sampaio contratou com os seus amigos americanos e vai nos custar os olhos da cara. Diz-se mesmo que as experiências realizadas, no morro da Favela, mostraram de que forma mágica iluminações yankees transformam, em palácios de “Mil e uma noites”, cubatas africanas.

O emir Mulay Málek ben-Bélek é especialista em agricultura. Ele já ensinou ao Sr. Carlos a fazer brotar do caroço da uva pés de algodão do mais estimável fio.

Além disto, conhece os outros gregos da mais alta antiguidade do que ele lê, não só em grego, como em árabe, tais como Aristóteles, Ptolomeu, Estrabão etc., até dos propriamente árabes, persas e hindus.

Uma tal sabedoria está a indicá-lo para professor de “relatividade”, na Escola Politécnica, ao lado das “Máquinas” do Sr. Frontin.

O emir Mulay tem 83 mulheres e 150 concubinas. Não as trouxe por dois motivos: a) por não haver grande necessidade; b) porque supôs que, aqui, não houvesse carros “especiais” em que as suas mulheres e concubinas pudessem passear pela cidade, islamicamente enclausuradas como manda o Alcorão. Desconhecia que, entre nós, há os carros-fortes da polícia...

Este homem eminente, entretanto, segundo dizem, está disposto a fazer-se bufarinheiro, no Rio.

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