11/11/2017

Pedras preciosas (Conto), de Humberto de Campos


Pedras preciosas

Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)

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Segurando o almirante pela manga da casaca impecável, a Baronesa forçou-o a sentar-se, de novo:

— Não, senhor, não pode ir; tem que contar-nos, agora, a virtude de todas as pedras preciosas exibidas pelas senhoras que aqui se acham.

— Eu? — obtemperou o ilustre marinheiro, levando a mão clara ao peitilho espelhante da camisa:

— Sim, senhor. É este o seu castigo.

E imperativa:

— Sente-se!

Generalizada, de novo, a palestra, a Viscondessa de São Germano indagou, com sincero interesse:

— É verdade, almirante é certo, mesmo, que a ágata é "porte-malheur"?

— É verdade, afirmam isso... — acrescentou Madame Sampaio Gomes.

O almirante contestou:

— É uma invenção recente, essa, D. Violeta. Os antigos, pelo menos, não dão notícia dessa propriedade. Plínio, que a ela se refere longamente, atribui-lhe a virtude de tornar os atletas invencíveis. Os egípcios indicavam-na como infalível contra mordedura das víboras, dizendo-se, mesmo, que as águias a colocavam no ninho para afugentar as serpentes, que lhes perseguiam os filhos.

— E o rubi? — indagou a Baronesa.

— O rubi é a pedra dos espíritos esclarecidos. Teofrasto aponta-o como um dos incentivos misteriosos da inteligência, circunstância que a levou, ao que parece, a ser adotada como pedra simbólica dos bacharéis. Outros acreditam que ele preservava contra a peste, contra os venenos, e contra outros perigos da vida. É, mais ou menos, como a esmeralda.

— Como a esmeralda?

— Sim. A esmeralda fortalece, também a inteligência, e cura, segundo Plutarco, as mordeduras de cobra. Alberto, o Grande, recomendava-a contra a epilepsia e Cornélio Agripa contra as hemorragias.

Foi por essa altura que a encantadora D. Ritinha, que até então se limitara a sorrir, fazendo companhia ao contentamento dos outros, aventurou, cândida:

— Mas, há pedras portadoras de desgraças; não há, senhor almirante?

— Dizem que a opala é desse número, minha senhora; mas eu não creio.

— Não crê?

E entre a atenção geral:

— Pois, olhe, há dois anos, meu marido ia sendo vítima de uma dessas pedras de mau agouro. Esteve muito mal!

— E que pedra foi essa? Pode-se saber?

A moça não lhe sabia o nome; a Baronesa correu, porém, pérfida, em seu auxílio:

— Era o carbúnculo; não era, Dona Ritinha?

A jovem senhora, desabituada àquele meio supercivilizado, bateu com a cabeça, confirmando, ingênua, a horrenda perversidade:

— É isso mesmo; era o carbúnculo. E compadecida:

— Quase ele morre, coitado!...

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