7/06/2018

Temas Poéticos: PRIMAVERA II


A Primavera

JAYME AUGUSTO DE CASTRO
"Poesias" (1871)

Já sopra o vento norte, e ao sul impele
Em grossos turbilhões a nevoa grossa,
Que o céu toldava do Brasil fecundo,
Além os cumes das erguidas serras,
Ainda umedecidos,
Despindo o manto da estação brumosa,
Qual polido Crystal, à luz resplendem
De um sol vivificante.
E a fonte pura, que do cimo agreste
De fraga em fraga ressaltando geme,
Em grossos flocos de luzente prata
A terra se desprende.
Aqui é ali os bosques se revestem
De folhas novas, de diversas flores;
E o prado, o vale, os montes e as colinas,
De um verde aveludado ao gado oferecem
Fresca pastagem com seus novos brotos.
Os bastos laranjais curvam-se ao peso
De seus dourados frutos saborosos,
Que se destecem das fragrantes flores
Que a virgem simbolizam.
E entre a escura folhagem esvoaçando
Os passarinhos num chilrar contente;
O terno sabiá no erguido galho,
Desfazendo-se em ondas de harmonia;
O lindo beija-flor verde-dourado,
Pairando ali com um segredar continuo,
Roubando à cada flor, que treme, e cede,
As doçuras de um beijo,
Nos arrancam da terra ébrios de gozo,
Envolta a mente em divinais eflúvios.
Tudo, tudo sorri: o céu sem nuvens,
Este céu do Brasil de azul tão lindo;
As cristas dos rochedos inda úmidas,
E as fontes que em cascatas se despenham,
Refletindo do sol a luz dourada;
Colinas, prados, vales, e as florestas
Mostrando o altivo Ipê com flores de ouro;
Laranjais, flores, frutos, passarinhos;
Tudo, tudo sorri, tudo anuncia
A formosa estação — A Primavera. —

★★★

A Primavera
(A Manoel J. de O. Rocha)

DARIO GALVÃO
"Ecos e Sombras" (1911)

Veste se a Terra inteira de esperança;
De seus lábios gentis — as meigas flores —
Evolam-se balsâmicos olores
Ao louro esposo que no azul avança.

Brilha um íris por lúcida aliança;
E a terra, lendo a música das cores,
Ensina o beijo — o canto dos amores —
À fera, à virgem pura, á rola mansa!

Passa nadando em luz a brisa em festa;
Cantão em coro os vates da floresta;
E o Sol, em honra á venturosa data,

Liberta as inocentes prisioneiras,
Solta as águas das alvas cachoeiras,
Fundindo os nós dos seus grilhões de prata!

★★★

Primavera

MÁRIO BEIRÃO

Vem, Primavera! Abre o sendal de flores na terra,
Estende o pálio azul no espaço,
lava num beijo o firmamento baço,
traz a magia das luzes e das cores!
Com teus perfumes entontecedores, aromatiza as balsas.
Passo a passo acorda os ninhos
e de teu regaço
lança a mãos plenas rosas, esplendores.
A natureza em júbilo te espera:
aclamando-te os pássaros bisonhos
já se põem a cantar, Mãe da quimera.
E em minh'alma, entre frêmitos risonhos,
em febril disparada,
ó Primavera,
passa a galope o batalhão dos sonhos...

★★★

Primavera

FRANCISCO JOAQUIM BINGRE

Passei a Primavera de meus anos
Com maternais desvelos amorosos.
Com meiguices, afagos carinhosos,
Com mimos de solícitos afanos.

Desenfaixado dos primeiros panos,
Pus-me em pé, dei passinhos vagarosos,
Logo corridas, saltos brincalhosos,
Travessuras de meninais enganos.

Nesta idade infantil da Primavera,
Com outros meus iguais brincões folgava.
Ah, quão gostoso, então, o tempo me era!

Inocente brincar só me encantava:
Feliz, se aqui ficando eu conhecera
A força do prazer que desfrutava!

★★★

Primaveras

CASIMIRO DE ABREU

Primavera! juventud del anno,
Mocidad! primavera della vita.
Metastasio

I
A primavera é a estação dos risos,
Deus fita o mundo com celeste afago,
Tremem as folhas e palpita o lago
Da brisa louca aos amorosos frisos.
Na primavera tudo é viço e gala,
Trinam as aves a canção de amores,
E doce e bela no tapiz das flores
Melhor perfume a violeta exala.
Na primavera tudo é riso e festa,
Brotam aromas do vergel florido,
E o ramo verde de manhã colhido
Enfeita a fronte da aldeã modesta.
A natureza se desperta rindo,
Um hino imenso a criação modula,
Canta a calhandra, a juriti arrula,
O mar é calmo porque o céu é lindo.
Alegre e verde se balança o galho,
Suspira a fonte na linguagem meiga,
Murmura a brisa: - Como é linda a veiga!
Responde a rosa: - Como é doce o orvalho!

II
Mas como às vezes sobre o céu sereno
Corre uma nuvem que a tormenta guia,
Também a lira alguma vez sombria
Solta gemendo de amargura um treno.
São flores murchas; - o jasmim fenece,
Mas bafejado s’erguerá de novo
Bem como o galho do gentil renovo
Durante a noite, quando o orvalho desce.
Se um amargo de ironia cheio
Treme nos lábios do cantor mancebo,
Em breve a virgem do seu casto enlevo
Dá-lhe um sorriso e lhe intumesce o seio.
Na primavera - na manhã da vida -
Deus às tristezas o sorriso enlaça,
E a tempestade se dissipa e passa
À voz mimosa da mulher querida.
Na mocidade, na estação fogosa,
Ama-se a vida a mocidade é crença,
E a alma virgem nesta festa imensa
Canta, palpita, s’extasia e goza.


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