1/23/2019

Temas Poéticos: MÃE - V

Minha mãe

L. J. VASCONCELLOS.
15 de maio de 1902.

Neste quadro solitário
A sombra do campanário
Talvez encontre o lugar;
Onde sem dó e cruelmente
Vieram os tristes viventes
A minha mãe sepultar.

E aqui achei a terra,
Que amada coisa se encerra
A quem tanto em vão;
Cadáver da mãe querida
Que nainh'alma dera vida
Neste mundo de ilusão!...

Se tens força abre o caixão,
Surge da fria gelada
Vá na região estrelada
Conversar com o Senhor Deus
Vá gozar a doce palma
Vá habitar lá nos céus.

***

A dor de um filho

ANTÔNIO BASTIN GAMA
Aracaju, 1 de julho de 1919.

A minha mãe morreu! Que dor aguda
Que me estrangula o coração aflito
Como depressa a sorte se transmuda,
Como o destino meu se fez maldito!

Morta! De dentro dessa campa muda,
Já nem mais ouve o desolado grito,
Que neste verso a minha dor desmuda.
E o pranto faz-me gotejar, bendito!

Mas que o seu nome seja-me o fanal,
Para eu buscar o bem, deixar o mal,
Da vida neste pélago profundo.

E que a lembrança deste nome santo
Sempre me assista, embora meio ao pranto
Até que eu deixe este maldito mundo?

***

Minha mãe

GONÇALVES LEITE
Itatiaia, 29 de março de 1902.

Criatura sublime que embalou-me
No berço infantil quando pequeno,
Que em desvelos velou-me os sonhos d'anjo
Cantando carinhoso canto ameno.

Que em desvelos sorria quando eu ria
E em prantos se banhava aos meus vagidos,
Sentindo as mesmas dores que eu sentia
Quando ouvia meus choros doloridos.

Criatura sublime, mãe bondosa
Que legou-me da vida a santa luz;
E com ela os sofrimentos de amargores
Que na estrada de abrolhos me conduz.

No sofrer e nas dores agras feras,
Que apunhalam meu peito tão descrente.
Eu vos vejo como via noutras eras
E sofro como um mártir paciente!

Criatura que eu adoro, que venero
No meu peito obscuro, fraco amante;
Estrela radiosa que me guia
Na vereda que sigo vacilante.

Vós sois minha mãe sacros odores,
Doce mel e lenitivo de minh’alma,
Vós sois do meu porvir risonhas flores
E sois do meu passado murcha palma!

Criatura que Deus predestinou
Ao humano Vivente sofredor,
Enchendo o coração bondoso, excelso,
De carinho, de desvelos e de amor.

E nas latas do sofrer o pobre vate
Orvalha estes versos com seus prantos,
E dedica o coração que opresso bate
A vós minha mãe meus fracos cantos!

***

Minha Mãe

JÚLIO PERNETA
Curitiba, 7 de novembro de 1898.

No teu olhar velado, olhar de morta,
Um supremo sorriso inda fulgura;
No cemitério, junto à sepultura
Onde repousas, minha dor aporta.

Soluçando e gemendo, aflita e louca,
Mãe, a Saudade invoca o meu passado...
Um soluço de fogo vem-me à boca,
E tudo abandonado!...

Somente na penumbra da agonia
A vaga sombra de uma cruz plantada
Fere a passagem rútila de um dia,
Dia de Sol da tua sombra amada.

Ai! minha mãe! caminho solitário
Dentro da noite acerba do meu tédio,
Como quem sobe a rampa de um calvário,
Repetindo o epicédio.

De uma saudade antiga e dolorida
Que a nossa alma aos poucos dilacera,
Quando a lembrança rasga essa ferida
Que tanto punge e tanto desespera;

Que teu lábio rezara, em mim pensando
Quando longe de ti, do meu degredo,
Eu vagava, a chorar, os pés sangrando
Nas urzes tredas do caminho tredo.

Ai! minha mãe, por isso agora, quando
Junto ao lugar sagrado onde repousa
Teu corpo, eu venho, em pranto, me arrastando
Para beijar a funerária lousa,

Perseguem-me em soturna procissão
Os fantasmas senis do meu passado,
Rezando o réquiem da recordação
À luz feral de teu olhar velado!

***

Mãe

VALE E SILVA
São Paulo, 31 de janeiro de 1898.

Vi-o: tinha no olhar as ânsias, o abandono,
As tristezas mortais de um mal indefinível
Parecia viver num como estranho sono,
Extasiado do além, do vago, do invisível.

A tísica o minava: o doce amor materno
Inda o prendia à vida, inda o ligava ao mundo:
E somente este amor imensamente terno
Alentava-lhe o peito exausto e moribundo.

Ao vê-la confortando-o, eu, torturado e mudo,
Recordei-me em pesar dessa longínqua idade
Onde nossa alma encontra, amargurada, em tudo
Uma sombra de amor, de mágoa e de saudade.

Veio-me a recordação de minha mãe piedosa:
Oh céus! porque jamais senti essa ventura
De tê-la junto a mim, de ouvir-lhe a voz saudosa,
Saudosamente doce e docemente pura!

Ela partiu tão cedo! E agora vendo o pranto
Desse enfermo, imagino-o o orvalho doloroso
Florindo o ciprestal do escuro Campo Santo
No coração entregue a fúnebre repouso...


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