1/23/2019

Temas Poéticos: MÃE - VI

Anjo da Guarda
(À minha mãe)

MÁRIO PAIM
São Paulo, 30 de dezembro de 1897.

Quanta vez contemplando o sórdido monturo:
Mundo sem ideal – jardim sem primavera –
Não tenho a nostalgia estranha doutra esfera
Por onde anda minh'alma em passo mal seguro!!

Mas cheio de ardimento, a soluçar, procuro,
Neste planeta, alguém cuja afeição sincera
Ah! me faça esquecer o país da quimera,
Jorrando intensa luz nas trevas do futuro.

E quanto mais a dor me prostra e me quebranta,
Mais serena ressurge à invocação da mente,
Minha mãe! minha mãe! a tua imagem santa!

Ao menos, vou pensando, um coração existe
Que sorri ao me ver sorrir contentemente
E que chora ao me ver chorar descrente e triste!

***

Minha Mãe

EDUARDO VIDAL
5 de junho de 1904.

Era febril! A minha fronte ardia!
...E o delírio de mim se apoderava!
Nestes dias de angústia, neste dia,
Presa de imensa dor — um anjo orava.

Era infeliz! Sem calma suportava!
O sofrimento atroz que me pungia!
E sempre ao lado meu cuidoso estava
Cm anjo a me lenir nesta agonia!

Era feliz! Mostrava-se ditoso
Este anjo que me alenta o me consola...
Este anjo que por mim vela, piedoso!...

É minha mãe aquele anjo clemente
Que triste eu vejo, se o meu pranto rola
E que se alegra quando estou contente

*** 

A minha mãe
(H. Heine)
12 de novembro de 1900.

Num momento de insensatez, outrora,
Fugi de vós: queria aos quatro ventos,
Ir em busca de amor, e, nuns momentos
De delírio, abraçá-lo... E, mundo a fora,

Vou. Mas em vão elevo meus lamentos:
Embora peço-o em lágrimas, embora...
Ante cada solar minh’alma implora!
E dão-lhes só o desprezo e o riso odientos!

Depois de sempre em vão tê-lo buscado
Um dia volto ao lar. Manso descerra
Uma porta. Éreis vós! Mudo e cansado,

Fitei a luz que vosso olhar encerra
E vi, surpreso, o amor tão procurado!
O amor mais puro que encontrei na terra.
 
***
Carta a minha mãe

SEBASTIÃO FERNANDES
Recife, 31 de julho de 1900.

Pura e divina, santa e imorredoura
Hás de sempre viver sublime e calma,
Dentro desta minh'alma sofredora,
Alma bondosa de minha própria alma!

Ó minha Mãe! Ó meu celeste ninho!
Traze-me sempre no teu coração;
Para que eu tenha sempre o teu carinho,
Para que eu beije sempre a tua mão!

Ela que é raio de um clarão profundo
A mim distende-a, pois, ó ser querido,
Para que ela me guie por este mundo
Como uma estrela ao viajor perdido...

Quando anoitece — alma sublimada,
Depois de alar-se pelo firmamento,
Vai repousar, qual ave torturada,
Meu pensamento no teu pensamento!

Ser dos seres em tudo o mais perfeito,
As minhas novas tu relês magoada,
E as tuas cartas guardo-as em meu peito
Como a relíquia um crente em beijos guarda.

Sei que povoam frias soledades
Os nossos corações de dor insanos...
Quanta tristeza, mãe! quantas saudades,
Neste horrível desterro de cinco anos!?

Quero contigo partilhar da lida,
Contigo ir desta existência além...
Tu que foste a alvorada desta vida,
Hás de ser seu crepúsculo também!

Sei que por mim tu velas e que existe
No teu velar um murmurar de prece...
E sou tão cheio de saudade e triste,
O quanto é triste o Mar quando anoitece!

Dá-me, como água fresca ao peregrino,
Para sanar-me da tortura as dores,
O teu amor que é em tudo o mais divino
E o mais puro de todos os amores!...

Fere-me o coração o agudo espinho
Desta saudade que jamais se acalma...
Mas como uma ave no mais casto ninho
Vive a tua alma dentro de minh'alma!

Ai! que nas trevas eu me perderia!
Ai! que seria de meu coração?
Se a mão que me protege e acaricia
Abandonasse minha frágil mão!

Que teus cuidados que me desvanecem
Façam-se em luz que sempre me acompanhe
Quando os afetos falsos desparecem,
Mais teu afeto cresce, ó minha mãe!

Que deste mundo sempre assim me esquive,
Até que venha o dia em que hei de ver-te...
Basta que saibas que teu filho vive
E que teu filho nunca há de esquecer-te.

***

Minha mãe

PIRES FERREIRA
Aracaju, 23 de julho de 1908.

De tudo que amo no mundo
Só minha mãe me estremece:
Sorri ao me vê sorrindo,
Se me vê triste entristece.

Só ela minha vida
Me sabe compreender:
Se choro, ela tristonha
Vem o meu pranto beber.

Infeliz de quem não tem
Uma mãe compadecida,
Que sabe chorar com o filho
Às desventuras da vida.

Me negando Deus o amor
Da mulher que inda bendigo,
Deu-me uma mãe carinhosa
Que sabe sofrer comigo.

Sê bendita, ó minha mãe,
Sagrada flor de meu horto!
Vive bem para que eu possa
Achar em ti meu conforto.

Quando a flor da juventude
Fugir-me nos seus arrancos,
Junto de ti beijarei
Teus lindos cabelos brancos.

E como não será doce
Eu e tu, nós dois juntinhos,
Vivendo na casa
Como dois tristes velhinhos!

Vive bem, ó minha mãe
Sagrada flor de meu horto,
Pois enquanto tu viveres
Terei em ti meu conforto.


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