
As
sonsas

— As minhas filhas não hão de querer
agora joias, pois elas não fazem outra coisa senão rezar.
Mas a adela pediu que ao menos a
recolhessem do ar da noite, e queria que a deixassem ficar no quarto das
meninas, porque assim ficava mais segura com as joias que trazia, que eram de
muito valor. A mãe falou nisto às filhas; e elas:
— Nós não queremos cá velhas; temos
muito que rezar.
A mãe disse:
— Ela fica aí para um canto do quarto,
porque não quero que em minha casa aconteça a desgraça de a roubarem.
A adela entrou para o quarto das
meninas; deitou-se e fingiu que dormia. Lá por alta noite entraram três
mancebos, que eram os namorados das três meninas, e cada um deixou uma coisa. A
adela, assim que viu esses objetos, agarrou neles e abalou.
No dia seguinte, o príncipe que era a
dita adela, esperou que anoitecesse, e foi a casa da filha do outro fidalgo,
bateu à porta, veio a mãe da menina; disse que trazia ali umas joias, para ver
se a menina quereria comprar.
Veio ela muito contente, esteve a ver as
joias, e, como isto levou tempo, disse:
— Minha rica velhinha, eu não quero
nada; mas como é tarde há de cá dormir, e fica no meu quarto.
Depois deram a ceia à velha, e ela foi
deitar-se para o quarto da menina, que lhe deu também a sua cama. A velha
fingia que dormia; a menina veio deitar-se. Penteou-se, rezou, despiu-se e
deitou-se sem camisa na cama. A adela, assim que a apanhou dormindo, pegou na
camisa e foi-se embora.
No fim de dias o príncipe mandou avisar,
para todos os fidalgos irem ao palácio com as suas famílias; quando estavam
presentes, chamou um cavaleiro e mostrou-lhe uma prenda e perguntou se a
conhecia.
O cavaleiro disse que sim, e que a tinha
deixado no quarto de uma menina. Fez mais perguntas iguais aos outros mancebos,
e as três beatas estavam muito envergonhadas. Chegou por fim a vez da menina da
camisa; chamou-a, e ela desatou a rir.
A mãe disse-lhe:
— Sustei-vos, filha, não vos rides.
— Ai, senhora! agora é que eu vejo que o
príncipe era a velha adela que me furtou a camisa.
O príncipe perguntou-lhe:
— Será esta a camisa?
— É sim senhor.
— Pois bem, aqui tem a sua camisa, e
saiba que deste instante por diante fica minha verdadeira esposa, e a estas
meninas dou-lhes a sentença que, como são muito beatas, se faça um convento
para as meter para sempre.
(Ilha de São Miguel — Açores)
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Pesquisa
e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)
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