1/21/2020

Ode à Língua Portuguesa (Poema), de José Albano


ODE À LÍNGUA PORTUGUESA

Língua minha, se agora a voz levanto,
Pedindo à Musa que me inspire e ajude,
Somente soe em teu louvor o canto,
Inda que a lira seja fraca e rude;
E tudo quanto sinto na alma, e digo,
Já que na alma não cabe,
Contigo viva e acabe — só contigo.

Língua minha dulcíssona e canora,
Em que mel com aroma se mistura,
Agora leda, lastimosa agora,
Mas não isenta nunca de brandura;
Língua em que o afeto santo influi e ensina
E derrama e prepara
A música mais rara-e mais divina.

Língua na qual eu suspirei primeiro,
Confessando que amava, às auras mansas
E agora choro, à sombra do salgueiro,
Os meus passados sonhos e esperanças;
Na qual me fez ditoso em tempo breve
Aquela doce fala
Que outra nenhuma iguala — nem descreve.

Língua em que o meu amor falou d'amores,
Em que d'amores sempre andei cantando,
Em que modulo os mais encantadores
E deleitosos sons de quando em quando
E espalho acentos inda nunca ouvidos
De mágoas e de gozos,
Queixumes amorosos — e gemidos.

Sempre e sempre te eu veja meiga e pura
Naquela singeleza primitiva,
Naquela verdadeira formosura
Que farei que no verso meu reviva.
E, se apenas um pouco se revela
Desse encanto jucundo,
Há de mostrar ao mundo — quanto és bela.

Outros andam o teu sublime aspecto
D'ornamentos estranhos encobrindo
Sem saber o que tens de mais secreto,
De mais maravilhoso e de mais lindo:
Em ti já não se nota o mesmo agrado
F eu não te reconheço,
Se o teu valor e preço — é rejeitado.

Quanta e tamanha dor me surge e nasce
De nunca ouvir aquele antigo estilo,
Mas eu fiz que ele aqui se-renovasse,
Para que o mundo enfim pudesse ouvi-lo.
E com todo o poder d'engenho e d'arte
Foi sempre o meu desejo
Ver-te qual te ora vejo — e celebrar-te.

Ah! como assim me enlevas e me encantas,
Ora chorando e rindo, ora gemendo;
E, se te outros ofendem vezes tantas,
Embora solitário, eu te defendo:
Eu te defenderei sem ter descanso
E em luta não inglória
Tu verás que a vitória — e a palma alcanço.

E em pago disto peço que me imprimas
Maior ternura na alma e não ma agraves;
Dá-me versos dulcíssimos e rimas
Eternas, peregrinos e suaves:
Dá-me uma voz melodiosa e amena,
Para que noite e dia
Diga a minha alegria — e a minha pena.

E não quero um som alto e retumbante
Para cantar d'amor ao inundo atento,
Pois não há língua que d'amor não cante,
Mas, nenhuma traduz o meu tormento;
Nenhuma se conhece que traslade,
Afora tu somente,
Do coração doente — a saudade.

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