Camilo, a sua vida e a sua obra
A meu
ver, um dos aspectos mais curiosos e mais impressionantes da obra de Camilo é o
que essa obra tem de comum com a vida do grande romancista. Dir-se-ia que em
cada página palpita o seu coração, estremece a sua alma. A obra de Camilo,
antes mesmo de ser o documento admirável duma época, é a síntese flagrante da
fisionomia moral que caracterizou o seu autor. Para adivinhar, para surpreender
bem o que há de confuso, de contraditório, de humano em todas as suas páginas —
bastará recordar a vida tumultuosa do autor de A Brasileira de Prazins e do Amor
de Perdição. Em cada um dos seus livros há o farrapo glorioso duma
reminiscência pessoal, ora alegre ora triste, ora sombria ora irônica, mas
sempre viva e sempre penetrante. Poder-se-ia dizer que a vida de Camilo foi o
mais sentido de todos os seus romances e, se Camilo não nos quis contar a todos
a sua vida (que obra admirável de dor e de sarcasmo!) deixou-nos nas páginas
dos seus livros os elementos para a reconstituirmos, quase traço a traço, com
as suas tristezas, com os seus desalentos, com as suas paixões. A maioria dos
seus personagens são auto-biografias. A maioria dos casos contados nos seus
romances tiveram o grande escritor por intérprete e por ator. Em cada página da
sua obra há um "momento" da sua vida. E ainda agora, ao escrever
estas linhas, eu penso que se Camilo não tem sido o "desgraçado" que
sempre foi em toda a sua vida — só Deus sabe se nós teríamos motivos para agradecer-lhe,
hoje, as lágrimas que ele nos tem feito chorar...
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LUÍS DE OLIVEIRA GUIMARÃES
16 de março de 1925.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2020)
LUÍS DE OLIVEIRA GUIMARÃES
16 de março de 1925.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2020)
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