O Passeio dos Bardos ao Baldeador (Poesia), de Floriano Alves da Costa

 

O PASSEIO DOS BARDOS AO BALDEADOR

AO SEU PRECEPTOR

O ILUSTRÍSSIMO SENHOR

JOÃO DA COSTA FREITAS,

como tributo de gratidão

O. D. C.

FLORIANO ALVES DA COSTA.

O PASSEIO DOS BARDOS AO BALDEADOR

Folgam no campo os naturais prazeres,

E a rústica alegria apraz aos Deuses.

Castilho (Primavera).

Que se desse um passeio além das plagas

Desta bela cidade do Janeiro,

Entre si dois amigos decidiram,

Dando destarte distração mais ampla

Às tão comuns fadigas do trabalho.

Foi então escolhido o ameno sítio

Que de Baldeador lhe dão o nome;

E já de antemão fruindo mil prazeres,

Descreviam na mente os dois amigos,

Os tantos regozijos que se gozam

No belo apreciar do belo campo,

Já contemplando a basta Natureza,

Já gostando real simplicidade,

Que difícil se encontra, ou não existe

Nesta nossa cidade populosa!

 Concebido o passeio, concordaram

Que no dia seguinte se embarcassem

Em direção ao porto do Coqueiro,

De onde então a pé seguir deviam

Até o sítio por eles destinado,

Onde, diante só da Natureza,

Que nesta nossa terra tanto sobra,

Resfolegar pudessem os enlevos

Que oferece o risonho panorama

Das montanhas, dos bosques, dos outeiros,

Onde tanta poesia se reúne,

Onde a alma do Bardo se extasia,

No doce meditar que o arrebata!...

 Gasto o dia anterior a esse dia

Em que tanto pensavam estes jovens,

Ao ponto destinado foram ambos

A fim de aí a eles se juntarem

Mais dois amigos, que tomaram parte

No belo distrair deste passeio,

Que tão grato prazer anunciava,

Num folgar tão ridente. Aí se achavam

Em breve reunidos todos quatro,

Quando em meio era o dia do seu giro:

Almo prazer em todos respirava,

Deu-se a voz da partida, ei-los se embarcam.

 Em sujo batel da roça,

 De cargas todo tomado,

 Entraram os quatro amigos

 Qual em pensar mais ousado:

 Cada um já assentado

 Contemplava o burburinho

 Que se fazia sentir

 No tão pequeno barquinho.

 De vinte quatro pessoas

 Já ele tomado estava;

 Mulheres, homens e cargas

 Tudo mal se acomodava:

 Entretanto, a tudo dava

 Maior graça, mais ação,

 Os ditos que proferia

 Do tal barquinho o patrão.

 Este, assentado na popa,

 Tomando do leme conta,

 Para seguir a viagem

 Bem galhardo já se apronta:

 A proa do barco aponta

 Para o sítio desejado;

 Soltam-se as velas e vê-se

 Já o ferro levantando...

 O vento a favor

 Que então se agitava,

 No barco empregava

 Toda atividade,

 Que em breve a cidade

 Nos fez tão distante,

 Que olhar penetrante

 Não mais descobria.

 Na vasta baía

 Então nos achamos,

 E a vista espraiamos

 Em seus arredores:

 Os belos verdores

 Das ilhas formosas,

 Serras alterosas

 Fomos contemplando.

 Fomos desfrutando

 Todo o panorama,

 Que assaz se derrama

 Nesta bela terra,

 Aonde se encerra

 Tanta poesia,

 De noite e de dia,

 Em todo o lugar...

 Nestes belos contemplar

 Todos engolfados iam,

 Que nem ao menos sentiam

 Do sol os ardentes raios.

 Tal era o contentamento

 Que a todos dominava,

 Em tudo graça se achava,

 Tudo era riso e ventura.

 Esquisitos pensamentos

 Pelo patrão emitidos,

 Feriam mais os sentidos

 Da bela reunião.

 Pois ninguém mais desejava

 Do que nós, se divertir;

 Em todos, doce sorrir

 Inefável se mostrava.

 Entanto o ativo vento

 Mais e mais se redobrava,

 O barco quase voava

 Impelido pela força;

 Até que tanto foi crescendo

 E a tal ponto se elevou,

 Que em breve se rebentou

 Uma das duas escotas.

 Aos gritos de “ferra a vela”

 A risada foi geral,

 Fazendo-se mais cabal

 O nosso divertimento.

 E em tais brincos

 Nos engolfando,

 Fomos passando

 Toda a baía.

 Em todos, prazer

 Se manifestava,

 Em todos reinava

 O contentamento,

 E em complemento

 A doce alegria

 De todos se via

 No rosto expressar.

 De tantos enlevos

 Foi o só motor,

 O Baldeador

 Já tão desejado!

 E tudo já tendo

 Bem analisado,

 Conforme o ensejo

 Nos foi permitindo,

 De-terra-uma voz

 Se deu, e nós todos

 Do barco da roça

 Nos fomos saindo.

 Então avistamos,

 Mesmo à nossa frente,

 Um alto coqueiro

 Já envelhecido,

 O qual nome deu

 Ao porto, que achamos

 De curta extensão,

 Mas apetecido.

 Pequenas casinhas,

 Em numero breve,

 De toco trabalho,

 Sem ordem alguma,

 Postadas em fila

 Ao longo da praia...

 Do Coqueiro o porto

 Este é, em suma.

E já em terra todos, espraiamos

A vista ao derredor do porto ameno;

Tudo nele animava, e assaz se via

A Natureza em tudo derramada

Neste sítio tão belo e pitoresco.

Aqui, de uma janela se mostrava

Como que a medo a pudica donzela;

Ali, o ancião curvado de anos

Desfrutava do porto a vista bela;

Estes, debaixo dos tamarinheiros,

Que em frente às casas ficam, junto à praia,

Abrigados do sol, se distraiam

Com os novos viajores que saltavam...

Oh! como é belo o habitar bem longe,

Bem longe, das cidades grandiosas!

Ali, a Natureza em toda a parte,

Nos homens e animais, na flor, nas ervas,

Nas casas, nos costumes dos seus povos;

Aqui o luxo e o estridor dos carros

Desses grandes do mundo... e o labirinto...

Tudo é confusão, tudo é bulício...

 Oh! como é belo o habitar bem longe,

Bem longe das cidades grandiosas!

Desfruta-se do campo almos prazeres,

No campo o homem em tudo se extasia!...

 E aí nós tendo

 Pago ao patrão,

 E as nossas malas

 Tendo na mão;

 Doce expansão

 Dêmos à vista,

 Pois que no porto

 Nada contrista.

 A estrada fomos

 Depois tomando,

 Que em frente estava

 Se nos mostrando;

 Fomos caminhando...

 Por todo o passeio

 Tudo era alegria,

 Tudo era recreio.

 E a casa avistamos, enfim,

 Que pôs cabo à viagem comprida;

 Nela, a simplicidade esculpida

 Nós achamos, no aspecto singelo.

 Isolada num campo, onde finda

 Mui custosa ladeira, escarpada,

 Sem abrigos ao vento, assentada

 Nós a vimos, e pois a saudamos.

 Oh! então a alegria se fez

 Dignamente expressar em nós todos;

 O contento se via nos modos,

 Nas ações, nas palavras, nos rostos.

 Já da casa as pessoas se apinham,

 E contentes nos vêm receber;

 Seus olhares expressam prazer,

 Tudo é natureza e bom grado.

 A cancela transpusemos

 E na casa nos achamos;

 Declinava o sol então,

 E à mesa nos sentamos,

 Pois da fome já em nós

 O efeito era sentido;

 Bem depressa devoramos

 O que então nos foi servido.

 E tudo acabado

 Deixamos a mesa;

 Fomos logo ver

 Do sítio a beleza.

 Na casa, pois, frequência limitada

Nós tivemos, porque somente o bosque,

O caminho, de matos abastado,

A si nos atraiam por um modo

Bem custoso de assaz o expressarmos:

Aí, sob uma árvore frondosa,

Qual é a do Brasil bela mangueira,

A sombra desfrutávamos contentes

A mais doce emoção de almos favores,

Quais os que a Natureza há concedido

A este nosso país de primavera!

 O regato que foge mansamente,

Em seu curso contínuo, murmurando,

Que após si as areias e as pedrinhas

Leva, no deslizar do seu caminho;

O meigo sabiá, terno ao ouvido

Quando a sua canção gorjeia alegre;

O alvinegro coleiro, cujo nome,

Amplamente lhe expressa a aparência;

O serrador, passarinho, que num galho

Sempre pulando, arremedar parece

Da serra o exercício na madeira;

O veloz beija-flor, esvoaçando,

E no ar se retendo, para destarte

Melhor fruir da flor o doce suco;

A leve mariquita, a borboleta,

De lindíssimas cores matizada,

Que nos deleita a vista, e em nós desperta

O poder vasto do Arbitro do Mundo...

Tudo isto para nós era um portento,

Tudo em nós era grande! e este espetáculo

Bem longe de encontrarmos nas cidades,

Nós juntos contemplamos, enlevados,

Bebendo a longos tragos gozos tantos,

Quantos podem fruir peitos amigos,

Que unidos desde a infância, se engolfavam

Agora meditando nestas obras

Tão grandes, tão sublimes, da Natura:

Dois peitos, que da idade dos errores

Saíram, para entrar na dos pensares,

Sempre juntos, e sempre alegres, dando

Mais um culto à Amizade, a cujo trono

De per si eles mesmos se elevaram,

Quando dos anos no verdor brincavam,

Quando suas ideias semelhantes

Pouco longe avançavam dos limites

Prescritos a idades tão nascentes...

 — Era pequena árvore plantada,

Por mão à experiência pouco afeita,

Para depois seus ramos alongando,

Chegar ao crescimento precisado

E oferecer o sazonado fruto:

Essa árvore crescida é já bastante,

E o fruto seu gozamo-lo mutuamente.

 Assim meditando,

 Do dia primeiro

 Passamos o resto:

 E quão lisonjeiro

 Nos foi tal deleite,

 O ar respirando

 Do bosque, tão puro!

 Até que escuro

 Tornando-se o dia,

 Não mais se podia

 Do Baldeador

 Os sítios notar.

 E então para casa nos fomos

 Muito prestes todos reunir,

 E aí conversando, tivemos

 Várias coisas com que distrair.

 Referimos, por tanto, o que achamos,

 E o que vimos de mais agradável;

 Para nós tudo era sublime,

 Tudo era bem admirável.

 E parte da noite

 Assim nós passando,

 Depois a findamos

 O solo jogando;

 Pois fora da corte

 De noite, o passar

 É mau, não havendo

 Um belo luar.

 E foi justamente

 O que aconteceu;

 O jogo, por tanto,

 Logo apareceu.

 Alta era a noite quando repoisamos

Os já bastante fatigados membros;

E ainda assim achávamos bem curto

O espaço que tivemos nesse dia

Para ver tudo, tudo apreciando;

Pois a noite tomou-nos pressurosa

Na nossa digressão tão animada,

Tão cheia de elevados pensamentos!

O dia desejávamos que em breve

Nos viesse fazer deixar os leitos:

E a estes desejos, que do peito eram,

Fazíamos juntar os pormenores

Dos passeios que, ao nascer de alva,

Havíamos de dar; pois que nós ambos

Ideias possuindo assaz ardentes,

Parecia-nos pouco tudo quanto

À nossa vista se nos amostrasse!

 Mas ah! que em face de desejos tantos

Tivemos de ceder bem humilhados,

Não mais cuidando da manhã seguinte

Nos passeios que havíamos pensado!

Oh! que a noite tornou-se bem espessa!

O trovão foi ouvido... e após momentos

Manifestou-se a chuva em abundancia!...

Tudo foi instantâneo; incontinente

A tristeza se fez igual em todos,

Grande parte cabendo aos jovens Bardos

Que infrutífero viam o passeio.

A chuva foi anuncio de má nova:

A chuva destruiu quantos projetos

Se tinham feito do passeio ao campo.

E ambos de tristura possuídos,

A nada atingiam mais, senão o como

Na roça passariam invernados.

Todos, nestes e noutros pensamentos

Pouco e pouco nos fomos entregando

Ao mole sono, a que enfim cedemos

Da chuva ouvindo o sussurrar monótono.

 O repousar foi breve, que avançada

Já era a noite, quando adormecemos!

 Do dia apenas se mostraram raios

Pelas frestas da casa, despertamos,

Para depressa o leito abandonarmos,

Para nos embrenhar no espesso bosque;

Pois que por cumulo de felicidade

O dia se tornara tão brilhante,

Como se não houvesse antes chovido.

 Bem dissemos o céu, do céu em face,

Admirados de prodígios tantos,

Tomando por favor de alta valia

Esta mudança, assaz inesperada!

Só de Deus a vontade onipotente

Tornar nos fez alegres, quando antes

Em triste meditar éramos todos.

 Procuramos então do rio as graças

Para aos nossos passeios dar começo:

Dele, à margem sentados, nossas vistas

Tão ávidas de encantos, espraiamos

Pelos contornos todos... quão sublime

Se nos mostrou então a Natureza!...

A par da solidão tão agradável,

Qual a do campo ao despontar da aurora,

Gomávamos prazeres eminentes

Tudo gostando e tudo admirando!

Oh! como é belo o habitar bem longe,

Bem longe das cidades populosas!

Como é doce ao nascer da manhã clara

Ouvir o meigo canto dos voláteis

Tão lindos, tão gentis, da nossa terra!

E estes, o seu gorjeio modulavam

Como o hino cadente oferecido

Ao no céu e na terra onipotente,

Ao Deus Senhor dá basta Natureza!

Assim eles saudavam bem contentes

O despontar do dia majestoso

Que, como nós, talvez não esperassem!

Saudavam do Senhor a só grandeza

No ledo gorjear tão inocente!...

 O verde bosque, a relva rociada;

O cântico das aves, tão saudoso;

O ar tão puro da manhã serena,

Do adusto sol ainda recatada;

As árvores frondosas, verdejantes,

Enfim, a Natureza admiramos

Nestes e noutros quadros bem tocantes!

Oh! que o sábio pincel na mão do homem,

Inda tocando do sublime a meta,

Jamais pode imitar grandeza tanta!

Uma empresa tamanha não lhe é dada:

Feitura destes quadros, Deus somente

Em Sua Onisciência fazer pode!!...

 E assim meditando

 Na vasta Natura,

 As nossas ideias

 Pareciam ser

 Uma só fatura.

 Amamos do campo

 A magna beleza;

 Amamos dos bosques

 A tanta solidão,

 Tanta singeleza!

 Enlevados gozamos assim

 A mais terna, a mais doce emoção,

 Engolfados em ideias que, juntas,

 Pareciam de um só coração!

 Pareciam de um só coração

 Os enlevos de almas tão dadas;

 E as nossas ações se formavam

 No pensar mais profundo escudadas.

 Tais eram as delícias que tornavam

Nossas almas assaz extasiadas,

E sempre assim, jamais tempo perdemos,

Tudo quisemos ver, e tudo vimos!

 Longas estradas, de abastado mato

Orladas na extensão indefinida,

Cortadas de outras tantas, que conduzem

Os viandantes a diversos pontos,

Ora direitas, ora tortuosas,

Alteadas aqui, ali suaves,

Irregulares todas, e de rios

Às vezes atalhadas; estas estradas

Tão solitárias sempre, e só deixando

Ouvir a intercalada melodia

Dos tantos plumivários passarinhos;

Destas estradas percorremos parte,

E apenas encontrávamos de espaço

Cavalgaduras guiadas por seus donos,

Que desciam ao porto, conduzindo

Os cereais, produtos recolhidos,

Das lavouras além desses lugares.

 E os poucos passageiros

 Que encontrávamos, mostravam

 Um caráter bem civil,

 Bem corteses nos saudavam.

 Às vezes alguma coisa,

 Só por curiosidade,

 Inquiríamos, e sempre

 Respondiam com bondade;

 Perguntando ora o destino

 De tão diversas estradas,

 Ora as distâncias, o fim,

 E as respostas eram dadas.

 Eis enfim já descrito quase tudo

Quanto fizemos, quanto de agradável

Achamos no Baldeador, no bíduo espaço,

Em que tantos prazeres desfrutamos

No belo apreciar dos belos campos;

Porém inda é forçoso que se digam

Duas palavras mais, para concluir-se

O trabalho espontâneo à que propus-me.

 À esquerda da estrada e pouco antes

Da casa, onde passamos estes dias,

E aonde recebemos os mais puros

Gasalhado e franqueza permitidos;

Esguardamos mui simples fontezinha

Abandonada aí ao tempo a tudo.

Ao passarmos por ela, contemplamos

Como triste e sozinha dimanava,

E apreciamos nela a Natureza,

Quão prodiga em seus bens oferecia

Naquela sua obra, tão propicia,

O doce refrigério ao viandante,

Libando a cristalina e pura linfa;

Mas, faltava-lhe o meio que fizesse

Chegar a tanto a sua utilidade,

Pois que em breve bacia pedregosa

A linfa de cristal se concentrando,

Desliza-se depois, à par seguindo

Por junto do caminho, ao morro junto.

Intentamos, portanto, para ela

Dos tantos cuidados nossos, uma quota

Dedicar, e o fizemos prontamente;

E, tanto quanto coube em nossas forças,

Empregamos, e após edificou-se

Pequeno chafariz que foi por ambos

Erigido em memória do passeio

Que fomos dar a tão jucundo sítio!

 Nenhum mérito existe nesta obra,

Que é trabalho imperfeito, e não permite

A duração dos séculos, desejada;

Porém nela quisemos tão somente

Chamar a atenção do viandante

A contemplar o monumentozinho

Em que (nos divertindo) oferecemos

Útil serviço àqueles que o quisessem.

 Este nosso trabalho foi saudado

Por juízos sensatos, em que viam

Distração tão somente de dois jovens;

Porém, a par das boas intenções,

Vinha também o gênio malfazejo,

Que nada podendo ver de utilidade,

De tudo destruir se regozija:

E o nosso chafarizinho, tão humilde.

Sofreu a destruição que almas mesquinhas,

Por doce galardão, lhe ofereceram!...

Toda a sua beleza reduziu-se

Ao primitivo estado, e a pobre fonte

Desliza agora humilde, como dantes,

Por junto do caminho, ao morro junto!

 E agora nem mais

 Existe um sinal,

 Que indique à quem passe

 Um trabalho tal.

 Que a pobre, coitada!

 Sofreu, como tudo,

 Do gênio do mal

 O mesquinho estudo.

 Embora quisesse

 Seu garbo ostentar,

 Por força lhe havia

 O mal atacar;

 Pois este contagio

 Em tudo se vê;

 Remédio não há:

 Também, para quê?

 Sublimes colossos,

 Obras grandiosas,

 Nada pois resiste

 As fúrias danosas.

 E a pobre, coitada!

 Sofreu, como tudo,

 Do gênio do mal

 O mesquinho estudo.

 Agora, nem mais

 Existe um sinal,

 Que indique a quem passe

 Um trabalho tal!...

 E dois dias passamos, bem contentes,

Nestas e noutras distrações tão ternas,

Que à pena e à ideia nos escapam:

Dois dias, que talvez bem tarde, ou nunca,

Teremos de gozar, como esses dias,

Em que tanta amizade se reúna,

Casadas no pensar dos jovens Bardos.

Tantas recordações, enlevos tantos,

Assaz nos preocupam inda, e damos

Largas ao pensamento, cogitando

Uma por uma as cenas de que fomos

Tão gratas testemunhas; e uma por uma

Tão íntimas ideias vem, dos Bardos,

Pousar junto das belas reflexões.

 Oh! salve dias felizes tão formosos!

Salve, ó Baldeador, a nós tão caro!

Tua imagem jamais será riscada

Das nossas recordações, assaz sinceras!

 E quando era a tarde

 Já adiantada,

 E já nossas malas

 Estando preparadas,

 Então terno adeus

 Dissemos, saudosos,

 Do Baldeador

 Aos sítios formosos:

 À toda a família

 Com quem nos achamos,

 Nossa gratidão

 Assaz penhoramos;

 Pois ampla franqueza

 Nos foi ofertada,

 Desde que no sítio

 Fizemos entrada!...

 Tomando enfim a estrada, a pé seguimos,

Contristados bastante das lembranças.

Despertadas em nós a cada instante

Que o Baldeador nos recordava,

E assim andando sempre, era já noite

Quando na jovem Niterói entramos,

 Onde embarcados

 O mar passamos,

 E assim chegamos

 À vasta corte.

 E dela já em terra, pressurosos,

Buscamos nossos lares, já pensando

Que um dia depois entrar devíamos

Nas tão comuns fadigas do trabalho!

.........................................

 Foi assim o passeio terminado

Que será para nós sempre lembrado.

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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2023.