Carlo Portinho, Cantor
Quando reencontrei Carlos
Alberto, quase vinte anos depois da última vez que o vi, descobri que
atualmente era Carlo Portinho, cantor. Fazer o quê? Como o sobrenome não havia
mudado, passei a chamá-lo de Portinho e pronto. Eu estava sozinho tomando um
chope no Bar Amarelinho, centro do Rio de Janeiro, mais precisamente na
Cinelândia, depois de um dia quente de verão.
Não havia mais tantos cinemas
nem teatros que outrora deram nome e fama ao lugar, mas sobrevivia a lenda de
que "os artistas se reuniam no Amarelinho". Dois últimos teatros
ainda funcionavam, mas se limitavam a apresentar shows musicais, peças de temas
picantes, eróticos, sexuais e heterossexuais. Agora, em vez do chope e do
charuto, os atores, cantores, músicos, humoristas, saíam da função direto para
enfrentar outros compromissos noturnos, onde complementavam os recursos para
sobreviver.
Ninguém mais saía do teatro
ou do cinema para o Bar Amarelinho, a não ser a gente solitária, os casais ou
grupos de amigos para tomar chope, um conhaque, um caldo afamado pelos poderes
afrodisíacos. Eu era um desses e a turma de homens e mulheres que fazia a mesa
onde estava Portinho era uma daquelas. Quando cruzamos o olhar deu-nos,
simultaneamente, aquela impressão "de já conhecer". Durou um tempo
até que eu resolvi puxar conversa e de novo nos identificamos entre tapinhas e
abraços, trocamos telefones, coisas assim.
Depois desse reencontro
natural nos veríamos muitas vezes. Portinho me convocava a cada apresentação
que ia dar numa casa noturna. Juntava-me a vários amigos deles que formavam uma
mesa de fãs entre aplausos e exigências de músicas especialmente interpretadas.
O grupo era variado e foi crescendo sempre. Era gostoso fazer parte de um grupo
de amigos que confiavam as alegrias e mazelas entre si. Foi num desses
encontros que Portinho conheceu Isolina.
Não importa saber em que
meandros funcionam os itinerários de uma memória que não cabe em mim. Fica
complicado. Depois, o que encontrei agravou-se ante o meu desconhecimento sobre
o que significa além do conhecimento. É essa aproximação
físico-espiritual, provocada pelo encontro
cara a cara, o conhecimento boca a boca, a fala íntima no ouvido, tudo
funcionando como um rito. O conhecimento imediato acaba penetrando pelos poros,
os lábios se espalham pelos dentes, as línguas se unem, o sabor da saliva é
reconhecido mutuamente. E aí vem o milagre das emoções, temperos diferentes que
se harmonizam.
Quando as faces se tocam,
quando a pele é aplainada pela ponta dos dedos em toda a extensão,
principalmente, quando o sal reage a qualquer dessas situações. Não é a mesma
visão traduzida pela distância e sim essa química insolúvel que às vezes
apavora aos desavisados. Uma proximidade tão íntima quanto à hora da morte. Mas
ali, naquele momento em que dois amigos se reencontram após
uma longa separação, trazendo no rasto a presença da mulher que vai
atravessar-lhes o destino como uma adaga trespassava o corpo dos sacrificados,
quem saberia?
O bagre desesperado. Era assim que Portinho chamava o bagre que eu
pegava primeiro, antes mesmo dele, quando íamos pescar às margens da enseada de
Botafogo, na época da construção do Aterro do Flamengo. A parte do aterro entre
a praia do Flamengo e a margem da enseada de Botafogo ia se transformando num
terreno entulhado por toneladas de pedra e barro do Morro de Santo Antônio,
empurrada mais para dentro, diminuindo o espelho d'água. O bagre desesperado vinha com a chegada da maré, faminto, ansioso,
jovem demais para desconfiar de um anzol com pedaço de tripa de galinha.
Por isonomia, eram também bagres desesperados os notívagos que se
atiravam à caça de prazeres, bebiam sem parar, conversavam loucamente, pegavam
qualquer parceiro, sem preconceito de sexo ou idade, mulher, bicha, travesti.
Ou se limitavam a fazer amigos que tivessem capacidade e paciência para ouvi-lo
horas e horas. Bagre desesperado era
o notívago que odiava a luz do dia, o sol, que só frequentava programas diurnos
em última instância, pelo prazer de um almoço exótico, feijoada, caranguejada,
mocotó, coisas assim. E qualquer deles bem acompanhado de parceiros, mulheres,
amores, música, violão e muita conversa, que se infiltraria noite adentro para
repetir as mesmas cenas.
Os pescadores de fim de
semana aproveitaram muito essa época, sentados nos pedregulhos de granito à
beira mar, pescando na ponta da linha curvinotas, pescadinhas, cocorocas e
sempre um bagre desesperado. Mais valia o encontro de amigos, o bate papo, as
bebidinhas, do que propriamente pescar. Pois foi assim: como o bagre desesperado se atira ao primeiro
anzol que aparece, que Portinho se entregou aos abraços de Isolina. Era uma
loura na moda, tipo Marilyn Monroe, cintura acentuada, quadris arredondados,
fala anunciada, sempre alegre, arremessando vastos risos no ambiente.
Para dizer a verdade,
Isolina também se atirou. Primeiro apaixonou-se pela voz de Portinho, que se
aproximava à de Altemar Dutra. Por isso repetia-lhe o repertório nas casas
noturnas que frequentava. Assim de namoro à primeira vista, Isolina deixava os
olhinhos verdes se denunciarem em brilho a cada apresentação do cantor. Para
Portinho foi uma boa, um ponto de equilíbrio, já que a companheira se adaptou
rapidamente à vida da noite. Tinha só 18 anos, mas parecia já conhecer tudo e
fazia amizades rapidamente. Para ele esse era um ponto positivo, as amizades
são necessárias para arranjar as coisas e conseguir um orçamento capaz de
aguentar a profissão.
Você poderá se sentir
deprimido nos relacionamentos afetivos e tentando tomar decisões drásticas, mas
o astral geral está positivo e os acontecimentos acabarão por lhe favorecer. As
pessoas ao seu redor ficarão encantadas. Também a sua habilidade para ganhar
dinheiro fica em alta. Há momentos de romantismo e generosidade. Esta é uma boa
fase para os solitários aumentarem o círculo de amizade. Pessoas novas,
interessantes, poderão cair na sua rede, algumas muito cheias de si e até
arrogantes, mas bastante confiáveis. Reaja contra isso
através do senso de humor, não para criticar ou rir, mas para perceber o quanto
é um atraso de vida a importância que damos a pequenas coisas. Tempestades.
Isolina parecia elétrica e
se atirou na vida noturna com fome e sede. Também tirava seus proveitos, fazias
outras amizades não necessariamente no interesse de Portinho. Aprendeu rápido e
em pouco tempo tinha suas economias, além de racionalizar o dinheiro do
parceiro. Tinha ligações com gerentes de banco, diretores de lojas, corretores,
gente enfim que daria um apoio necessário às suas necessidades de manter o
dinheiro bem aplicado e ativo. Nas compras explorava ao máximo esses contatos
noturnos. Ao vê-la agir de maneira desenvolta Portinho não pensou uma só vez
que tinha tido muita sorte em encontrar Isolina e tê-la como companheira. Além
disso não ia sua imaginação, leve e solta, desimpedida e descompromissada,
pensava, ou melhor, não pensava, como
a maioria dos cantores e músicos que trabalham de noite.
Volta à sua memória a ideia
de que é importante ter um mínimo de conforto e segurança material na vida.
Aproveitar esse período, que é mais incisivo. Você estará querendo romance e
muita aventura, mas a pessoa amada pode parecer um pouco fria: não se preocupe
nem desespere.
Sentimentos variados,
estado emocional que se altera ao sabor do tempo, falta de concentração e de
interesse. Se não conseguir mesmo se concentrar diminua o ritmo, descanse bem à
noite, tome um antidepressivo, amanhã você acordará novinho em folha. Esses
eram temas que jamais passariam na cabeça de Portinho...
Isso dá ao momento uma fase
de muita insegurança emocional, uma carrada de apegos e insegurança emocional,
cobranças indevidas, maldades, pequenos ódios. Não perca tempo olhando para
trás nem tente entender o que houve. Neste momento você estará fazendo um
balanço, reavaliando cruamente suas conquistas, o seu comportamento. É claro:
você nunca foi nem será perfeito, porém nada de culpas premeditadas.
Faça com seu dia seja o
mais leve possível, tendendo a realizar tudo com prazer e alegria de um modo
geral. Pode surgir uma inquietação, assim do nada, aumentando um enorme desejo
de se divertir a todo custo. Tudo bem, mas evite atirar-se cegamente em buscas
de emoções intensas demais. Nunca é tarde para dar uma paradinha...
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Fonte:
Salomão Rovedo: O Sonhador. Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2016. (Imagem: Páginas pessoal do autor)
Fonte:
Salomão Rovedo: O Sonhador. Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2016. (Imagem: Páginas pessoal do autor)
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