7/04/2018

Temas Poéticos: FLOR - III


As duas flores

CASTRO ALVES

São duas flores unidas
São duas rosas nascidas
Talvez do mesmo arrebol,
Vivendo no mesmo galho,
Da mesma gota de orvalho,
Do mesmo raio de sol.

Unidas, bem como as penas
Das duas asas pequenas
De um passarinho do céu...
Como um casal de rolinhas,
Como a tribo de andorinhas
Da tarde no frouxo véu.

Unidas, bem como os prantos,
Que em parelha descem tantos
Das profundezas do olhar...
Como o suspiro e o desgosto,
Como as covinhas do rosto,
Como as estrelas do mar.

Unidas... Ai quem pudera
Numa eterna primavera
Viver, qual vive esta flor.
Juntar as rosas da vida
Na rama verde e florida,
Na verde rama do amor!

★★★

Floriram por engano as rosas bravas

CAMILO PESSANHA

Floriram por engano as rosas bravas
No Inverno: veio o vento desfolhá-las...
Em que cismas, meu bem? Porque me calas
As vozes com que há pouco me enganavas?

Castelos doidos! Tão cedo caístes!...
Onde vamos, alheio o pensamento,
De mãos dadas? Teus olhos, que num momento
Perscrutaram nos meus, como vão tristes!

E sobre nós cai nupcial a neve,
Surda, em triunfo, pétalas, de leve
Juncando o chão, na acrópole de gelos...

Em redor do teu vulto é como um véu!
Quem as esparze - quanta flor! - do céu,
Sobre nós dois, sobre os nossos cabelos?

★★★

Flor de pessegueiro

ANTÔNIO FEIJÓ

A melindrosa flor de pessegueiro
Deixei-a, como dádiva de amores,
A essa que tem o rosto feiticeiro
E os lábios cor das purpurinas flores.

E a tímida andorinha, de asas quietas,
Dei-a também como lembrança minha,
A essa que tem as sobrancelhas pretas,
Iguais às asas da andorinha.

No dia imediato a flor morria,
E a andorinha voava, entre esplendores,
Sobre a Grande Montana onde vivia
O Gênio oculto que preside às flores.

Mas nos seus lábios, como a flor abrindo,
Conserva a mesma carnação,
E não voaram, pelo azul fugindo
As asas negras dos seus olhos, não!

★★★

De açucenas e rosas misturadas

ALVARENGA PEIXOTO

De açucenas e rosas misturadas
não se adornam as vossas faces belas,
nem as formosas tranças são daquelas
que dos raios do sol foram forjadas.

As meninas dos olhos delicadas,
verde, preto ou azul não brilha nelas;
mas o autor soberano das estrelas
nenhumas fez a elas comparadas.

Ah, Jônia, as açucenas e as rosas,
a cor dos olhos e as tranças d'ouro
podem fazer mil Ninfas melindrosas;

Porém quanto é caduco esse tesouro:
vós, sobre a sorte toda das formosas,
inda ostentais na sábia frente o louro!

★★★

A órfã e a flor
(À minha filha Cecília)

ATAÍDE MARCONDES
"Amarantos: versos" (19..)

No jardim de minha vida
Existe mm flor mimosa
Tão debilzinha pendida!
— Sem orvalho, fenecida,
Balança a flor desditosa!

Um dia esbelta criança
Lhe disse: — ó flor por que tremes
No galho que te embalança?
Perdeste alguma esperança?
Conta-me, ó flor, por que gemes?

Responde a flor: — Se estou triste
Se choro e gemo, é por ti!
A sorte nisto consiste:
— O meu perfume perdi
E tua mãe já não existe!...

A criança então lhe deu
Um beijo e disse: — Se choras
Por minha mãe que morreu,
Se minha sorte deploras,
Ó flor, ai! que direi eu?


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