
QUITE COM A VIDA
Sentiu-se
velha pela primeira vez aos vinte e cinco anos de idade!
Até
então não alimentara a menor preocupação com o tempo, nem havia formulado
qualquer reflexão filosófica sobre a velhice, bem como dos seus naturais
efeitos. Agora, porém, aquelas duas linhas de expressão bem no meio da testa,
entre as sobrancelhas, vinham deitar abaixo suas ilusões de juventude,
brotando-lhe na alma um sentimento de tristeza e frustração, como se apenas ali
descobrisse que a vida era breve.
O
espelho, que até então se lhe mostrara indiferente, passou a exercer sobre ela
uma atração quase molecular, como que na química. Mirava-o repetidas vezes ao
dia, não porque se tornara repentinamente vaidosa, mas para ter a certeza de
que suas feições preservavam os traços da primeira mocidade.
Em
vista disso passou a observar perscrutadoramente outras mulheres, a fim de se
comparar com elas, a ver se os vestígios da idade lhes eram mais expressivos, e
se deliciava no seu íntimo quando as viam mais afetadas pelas intempéries do
tempo.
Essa
melancólica constatação de que envelhecia acrescentou-lhe ainda novos hábitos,
os quais, com o passar dos anos, converteram-se em verdadeiras manias e
obsessivos vícios. Tornou-se comum, por exemplo, a peregrinação a
dermatologistas e esteticistas, que lhes prescreviam cremes e lhes apresentavam
as mais variadas dicas de como manter a pele saudável e evitar o aparecimento
das rugas.
Aos
quarenta anos já havia se utilizado de tudo, das substâncias antioxidantes aos
ácidos glicólicos. Experimentou ainda a harmonização facial, o lifting, o peeling, a vacina anti-idade, os esfoliantes, as hidratações, a
máscara de ouro, o botox, entre outros inúmeros tratamentos disponíveis no
mercado, os quais, se não surtiam resultados duradouros, ao menos originavam um
efeito psicológico confortador, que lhe fazia sentir mais jovem e mais feliz.
Mas
o tempo pareceu correr mais rapidamente do que costumava, e com ele seguiu-se a
angustiosa desilusão da Sibila. Aos cinquenta anos apresentava as
características típicas da idade, não obstante todos os cuidados que até aí tivera
para camuflá-las. Quando sozinha, diante do espelho, transbordava-se de uma
amargura íntima e irresignada, que a fazia desesperar-se. Não era propriamente
o medo da velhice, mas de sua inevitável consequência.
Com
o decorrer dos anos tornou-se amargurada e infeliz, permanecendo a maior parte
do tempo enclausurada dentro de casa, onde se consumia em angústias e
tristezas. Assim esteve longos anos, introspectiva e imersa em ponderações
filosóficas.
Um
dia, porém, surgiu-lhe de súbito um inexplicável interesse pelas coisas simples
da vida. Foi quando, por fim, desistiu dos cosméticos e dos demais subterfúgios
oferecidos pela indústria da beleza. Os cabelos, outrora tingidos, agora se
viam grisalhos e longamente caídos sobre os ombros. As roupas passaram a
refletir o desapego pela ostentação e pelo luxo. O rosto transparecia uma
placidez natural, sem qualquer disfarce. Doravante tudo nela era simplicidade e
desprendimento.
E foi assim, sem extravagâncias, sem prestígio público e sem grandes remorsos, que chegou ao termo dos anos. Sentia-se quite com a vida, que considerava seu único e verdadeiro legado.
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