1/23/2019

Temas Poéticos: MÃE - VIII


Beleza

ALMEIDA GARRETT
“Folhas Caídas”

Vem do amor a Beleza,
Como a luz vem da chama.
É lei da natureza:
Queres ser bela? – ama.

Formas de encantar,
Na tela o pincel
As pode pintar;
No bronze o buril
As sabe gravar;
E estátua gentil
Fazer o cinzel
Da pedra mais dura...
Mas Beleza é isso? - Não; só formosura.

Sorrindo entre dores
Ao filho que adora
 Inda antes de o ver
– Qual sorri a aurora
Chorando nas flores
Que estão por nascer –

A mãe é a mais bela das obras de Deus.
Se ela ama! - O mais puro do fogo dos céus
Lhe ateia essa chama de luz cristalina:

É a luz divina
Que nunca mudou,
É luz... é a Beleza
Em toda a pureza
Que Deus a criou.  


***

Adeus, mãe!

ALMEIDA GARRETT
“Folhas Caídas”

– “Adeus, mãe! adeus, querida
Que eu já não posso coa vida
E os anjos chamam por mim.
Adeus, mãe, adeus! ... Assim,
Junta os teus lábios aos meus
E recebe o último adeus
Neste suspiro... Não chores
Não chores: aquelas dores
Já sinto acalmar em mim.
Adeus, mãe, adeus!... Assim,
Junta os teus lábios aos meus...
Um beijo - um último... Adeus!”

E o corpo desanimado
No colo da mãe caía;
E ela o corpo... só pesado,
Só mais pesado o sentia!
Não se lamenta, não chora,
E quase a sorrir, dizia:
“Que tem este filho agora,
Que tanto pesa? Não posso...”
E uma a uma, osso por osso,
Com a mão trémula tenta
As mãozinhas descarnadas,
As faces cavas, mirradas,
A testa inda morna e lenta.
“Que febre, que febre!” diz;
E em tudo pensa a infeliz,
Tudo que há mau lhe ocorreu,
Tudo - menos que morreu.

Como nos gelos do Norte
O sono traidor da morte
Engana o desfalecido
Que imagina adormecer,
Assim cansado, esvaído
De tão longo padecer,
Já não há no coração
Da mãe força de sentir;
Não tem já lume a razão
Senão só para a iludir.

Acorda, ó mãe desgraçada,
Que é tempo de despertar!
Anda ver a eça armada,
As luzes que ardem no altar.
Ouves? É a rouca toada
Dos padres a salmear!...
Vamos, que a hora é chegada,
É tempo de o amortalhar.

E os anjos cantavam:
“Aleluia!”
E os santos clamavam:
‘Hosana!”
Ao triste cantar da Terra
Responde o cantar do Céu;
Todos lhe bradam: “Morreu!”
E a todos o ouvido cerra.

E os sinos a tocar,
E os padres a rezar,
E ela ainda a acalentar
Nos braços o filho morto,
Que já não tem mais conforto,
Mais sossego neste mundo
Que o jazigo úmido e fundo
Onde há de ir a sepultar.

Levai, ó anjos de Deus,
Levai essa dor aos Céus.
Com a alma do inocente
Aos pés do Juiz Clemente
Aí fique a santa dor
Rogando à Eterna Bondade
Que estenda a imensa piedade
A quantos pecam d’amor.

***

A minha mãe

JÔNATAS SERRANO
19 de novembro de 1903.

Abençoa-me, Mãe; que neste dia,
Talvez o mais feliz de minha vida,
Possa gozar minh'alma embevecida
Tão pura, tão benéfica alegria.

Ao receber-te a bênção comovida,
Eu julgo ouvir, em doce fantasia,
Os coros de uma angélica harmonia,
No céu, longe da terra corrompida.

Abençoa-me, Mãe; eu só desejo
Saber que vivo dentro de teu peito,
Que lá tenho um refúgio; que lá brilho.

E Deus permita que essa mão que beijo,
Cheio de amor e cheio de respeito,
Dirija sempre os passos de teu filho.

***
  
Mãe

LEÔNCIO CORREIA
8 de julho de 1911.

I
Mãe! minha mãe! na augusta claridade
Dos teus olhos, tranquilos e radiosos,
Ri-se o céu; e, se o céu não rir, quem há se
Rir, acaso, por olhos tão piedosos?

Como as estrelas, pela imensidade,
Desenrolam-se nele os dons formosos
Dessa alma, e os vejo, mãe, com que saudade!
Com que sabor de beijos lacrimosos!

Sonhei: – em raios de astros, dos azuis
Paços, descendo, um anjo, ao ver-me triste,
Como a casta ninfeia nos pauis,

Disse, com um doce, com um divino chiste:
Porque choras, feliz, se ainda possuis
O amor mais santo que na terra existe?

II
Roubem-me o riso, os ramos desflorindo
Da vida; e os sonhos roubem-me, que mudo
E frio quedarei ante o que lindo
Era, e tornou-se tenebroso e rude.

Que rinja, e rua, e role, retinindo,
Meu Torreão de Marfim; e, que eu, desnudo
De Fé, mendigue... Do desastre infindo
Ficando o teu amor, fica-me tudo.

Pois que a vida me dando, mãe, me deste
Parte da tua, e o teu amor, que enlaça
Meu ser, como uma faixa azul-celeste,

Sei que darias, com um sorriso doce,
Para salvar teu filho da desgraça,
A própria vida, se preciso fosse...

***

Dor suprema
(À minha mãe)

SOARES BULCÃO.
“Helianthus”, 1908.

Tento exprimir, ó mãe, debalde tento
Contar a dor nas sílabas de um verso,
O amor materno, em lágrimas, disperso
Pelo intérmino mar do sofrimento.

Procuro o pranto, o lúgubre lamento,
Tudo o que geme no martírio imerso,
E essa agonia eterna do universo
Não diz o teu sofrer de um só momento!

Sondo da noite os tétricos gemidos;
Ocultos ais dos corações feridos,
A angústia, a pena, o dó que me insinuas...

E esse concerto de ânsias e queixumes,
Capaz de encher milhares de volumes,
Mãe! não vale uma lágrima das tua!


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