6/22/2019

Cunhã Etá Maloca (Conto), de Barbosa Rodrigues



Cunhã  Etá  Maloca
Dizem que havia outrora, no Rio Uanauá, moças virgens que guardavam os talismãs e os atributos de Jurupari.
Dizem que uma vez fugiu uma das moças e foi procurar marido.
Chegando ao mato e anoitecendo aí dormiu. De madrugada estava chorando quando ouviu homens falarem.
Um deles estava dizendo:
— Eu não me hei de casar; se encontrar uma moça bonita então me casarei.
Depois disso encontraram a moça, e o homem, vendo-a, achou-a formosa e ela também o achou bonito.
O homem lhe disse:
— Queres te casar comigo? A moça disse:
— Quero.
O homem então levou-a para sua terra.
Aquele homem era da nação Jacamim.
Os pais os casaram e depois de casados foram eles banhar-se no riacho e aí acharam a erva jacamim com a qual esfregaram o corpo e se lavaram.
Dizem que então ambos transformaram-se em jacamins.
Depois disso sentiu que tinha ovos e a barriga cresceu a não poder mais andar.
Dizem que a mulher dissera:
— Isto não são ovos, isto talvez sejam filhos.
Alguns meses depois deu à luz duas crianças, uma mulher e um homem.
Foram crescendo as crianças.
O menino era forçoso e dizem que gostava de frechar, pelo que a mãe lhe disse:
— Meu filho, em tempo algum tu frecharás Jacamins.
A mãe deles nunca os vira quando dormiam; uma noite, porém, foi vê-los dormir.
Olhando para seus filhos assustou-se.
A menina, dizem que tinha sete estrelas na testa, e o menino uma cobra de estrelas enrolada no corpo.
A mãe ficou assustada e chamou o marido para ver as crianças.
Veio o pai delas e assustou-se também.  Falou.
— Eu sou ave, corno é que tenho crianças? Depois disso, dizem, foi ter com os pajés e disse-lhes:
— Que quer dizer isto, eu sou ave e minha mulher tem crianças?
Os pajés disseram-lhe:
— Também são teus filhos. Quando estiveste com tua mulher ela estava olhando para as estrelas e por isso saíram as estrelas neles.
Enquanto o pai conversava com os pajés e a mãe foi também passear, o menino pegou nas frechas e no arco e foi caçar.
Encontrou Jacamins e matou todos.
Depois de ter morto todos, vieram outros que também matou. Depois foi para casa.
Ele disse à mãe.
— Minha mãe! Eu matei todos os Jacamins. Vamos ver?
— Vamos.
Quando eles chegaram ela viu que o menino tinha morto o pai e todos os pajés. A mãe disse-lhe:
— Meu filho, tu mataste teu pai e bem assim os pajés; agora ninguém nos dá o sustento. Tu nos estragaste muito.
Então dizem que o menino respondera:
— Não entristeça o seu coração, mãe, para isso estou eu, o que faltar eu lhe darei.
Depois disso foram para a terra dos avós.
Em caminho disse ao filho:
— Meu filho, como chegaremos à terra de teus avós? Quando outrora de lá saí não tinha filhos, estava virgem, agora teu avô há de querer meter-me na casa tenebrosa para que eu não conheça homens.
— Deixe estar, minha mãe, eu verei, quando eu chegar lá eu acabo com essas coisas.
Quando eles chegaram na terra do avô, o menino pegou numa grande pedra e lançou sobre a casa e a achatou: as mulheres todas que lá estavam fugiram. A pedra que caiu pelo seu próprio peso afundou-se pela terra.
O avô quando viu aquilo teve medo do menino e toda aquela gente também teve medo dele.
Dizem que, então, o chefe falara:
— Eu toda vida estimarei muito a vocês, mas só quero que consertem o que estragaram e ponham tudo como anteriormente estava.
Disse então o menino ao chefe.
— Eu também gosto de ver todas as coisas em seu lugar.
Ficaram então bem na terra dos parentes.
Depois disso, a menina por não ter marido adoeceu.
O menino então disse a sua mãe:
— Dê para mim minha irmã para eu levá-la e curá-la, porque só eu sei onde está o remédio.
Deste modo o irmão levou-a para o céu, por não querer que ela se curasse e é ela que agora vemos e chamamos as Sete Estrelas (Plêiadas).
Vendo depois disso, a mãe, que eles se demoravam foi-lhes no encalço a procurá-los e quando passava por um riacho a cobra grande a engoliu.
Quando chegou, o filho macho, não achando a mãe, foi também à sua procura.
Foi por todas as terras e por onde foi passando deixou filhos até encontrar sua mãe.
Depois de achar a mãe levou-a para o céu.
Ela é hoje aquela estrela que nós chamamos Pinon ou Cobra Grande.
O que eu conto foi no nosso princípio, na origem de nossos avós.

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Pesquisa, digitalização e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)

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