3/18/2025

A boa menina ("Histórias da Baratinha"), por Figueiredo Pimentel


A BOA MENINA

Junto ao soberbo palácio do Marquês de Santos Sousa, havia a humilde mansarda do operário Joaquim.

Nesta, a miséria, a enfermidade, as lágrimas de sangue; naquele, os risos, os rapazes, os bailes e as patuscadas.

Numa noite em que o marquês dava uma das suas festas habituais, o pobre Joaquim expirou nos braços da esposa desesperada, em presença de três filhos, três pequenitos que não podiam compreender a intensidade daquela desgraça.

O marquês tinha também uma filha, que se chamava Lúcia, e era a criança mais adorável que imaginar se pode.

Soube Lúcia que em casa do morto não havia sequer dinheiro para o enterro, e foi ter com o pai.

— "Papai o senhor me dá cinqüenta cruzeiros?"

— "Para que queres tu cinqüenta cruzeiros?"

— "Para fazer uma esmola. Morreu o Joaquim, pobre pedreiro nosso vizinho, que há muito tempo se achava doente e a viúva não tem com que fazer o enterro".

— "Minha filha, a viúva pediu-te alguma coisa??"

— "Não, senhor".

— "Então deixa-a lá. Não te habitues a dar esmolas sem que t'as peças. Há muito com que gastar dinheiro. Olha, sabes quanto me custou a festa desta noite? Perto de dois mil cruzeiros..."

* * *

Vendo que o pai recusava atendê-la retirou-se enquanto nos olhos bailavam duas lágrimas.

Foi ao seu quarto, pôs nos ombros um manto de seda, tirou de um armário um pequeno cabaz desceu ao jardim, apanhou as flores mais bonitas e viçosas, meteu-se no cabaz, e saiu para rua, apregoando:

— "Quem compra estas flores? Quem compra estas flores? Vendo-as para ajudar as despesas do enterro do pobre Joaquim. Quem compra estas flores?"

Uma hora depois, a boa Lúcia entrava em casa da viúva e entregava-lhe algumas pobres moedas de níquel.

Os três passageiros, furiosos levantaram-se e olharam para cima, enquanto novas moedinhas fustigavam-lhes a cara.

Giovani, colérico, vermelho, saía dizendo-lhes:

— "Podem guardar o seu dinheiro. Eu não aceito esmolas de quem insulta a minha pátria!"


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Pesquisa, transcrição e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)

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