Gravemente enfermo, caíra prostrado
numa cama o poderoso sultão Abou-Malek.
De todas as partes vieram remédios,
sábios e curandeiros; fizeram-se preces públicas; prometeram-se honras e
fortunas a quem o salvasse.
Apareceu um dia em palácio uma
velhinha, declarando que o sultão só se restabeleceria,, ficando radicalmente
curado, se vestisse a camisa de um homem feliz.
Imediatamente partiram mensageiros
a procurar esse homem feliz, com ordem de lhe comprar a camisa por qualquer
preço, ou arrancá-la à força, se ele a não quisesse ceder.
Principiando pela capital do reino,
os emissários foram bater nos palácios dos ricos; depois dirigiram-se aos
remediados; falaram por último com os pobres.
Seguiram, então, pelas pequenas
cidades e aldeias, conversando com os camponeses. Passaram por todas as vilas,
esquadrinharam todos os lugares. Em parte alguma encontraram um só homem feliz.
Os ricos queriam ser mais ricos
ainda; os pobres desejavam fortuna; os doentes queriam saúde; soldados,
oficiais, padres, operários, lavradores todos tinham ambições e desejos.
Os mensageiros, inteiramente
desanimados, regressaram para a capital.
Uma tarde, passando por uma vasta
campina, encontraram um pastor sentado à sombra de uma copada árvore, tocando
flauta. Ao longe, o rebanho pastava tranquilamente.
A fisionomia do pastorzinho
respirava honestidade, calma e contentamento.
Um deles lembrou-se de lhe dirigir
a palavra:
— "Vejo-o sentado aí, tão a
seu gosto, que sou capaz de apostar que você nada mais deseja, camarada".
— "E se o senhor apostasse,
ganharia pela certa", respondeu o pastor.
— "Como?" tornou o outro
admirado. "Então, você nada ambiciona? nada quer?"
— "Nada".
— "Não desejaria ser rico? ser
nobre? viver num palácio? morar na corte?"
— "Nada disso dá a felicidade
que gozo".
— "Mas você é verdadeiramente
feliz?" insistiu o mensageiro.
— "Já lhe disse: sou feliz e
nada quero".
— "Então há de me fazer um
favor: preciso muito da sua camisa".
— "Minha camisa?"
perguntou o pastorzinho, admirado.
—
"Sim, sua camisa".
— "Ah! isso é coisa que lhe
não posso dar". "Pois compro-a".
— "Também não posso
vender".
— "Faça preço; e, por mais
absurda que seja a quantia, nós lha pagaremos".
— "Mas se eu já lhe disse que
não posso dar nem vender a minha camisa!..." falou o pastorzinho.
— "Será, então, à força...",
disse o mensageiro.
E ele e os outros, atiraram-se sobre
o pastor e arrancaram-lhe o paletó.
— Ah!... O homem feliz não tinha
camisa, e por isso não podia vendê-la nem dá-la!...
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Pesquisa, transcrição e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)
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