3/18/2025

A centenária ("Histórias da Baratinha"), por Figueiredo Pimentel


A CENTENÁRIA

Genoveva, a velhinha tia Genoveva, já tinha quase cem anos, um século de idade, um infinito de misérias e padecimentos!

Uma noite achava-se ela sozinha no seu quarto.

Estava a pensar na sua vida passada, em todas as suas desgraças. Tinha perdido primeiro seus pais; depois seus irmãos; seus parentes; seu marido; por último, seus filhos. Gerações e gerações passaram; crianças nasceram, morreram. Só ela ainda vivia.


No coração sentia tão profundo desgosto, que chegou a amaldiçoar o próprio Deus.

Engolfada assim nesses tristes pensamentos, pareceu-lhe ouvir tocar à missa das almas.

Admirada por ver que a noite correra tão velozmente, foi para a igreja.

Aí chegando, viu toda a matriz iluminada, não com as velas de cera dos altares, mas por uma claridade opaca, amortecida.

O templo estava repletíssimo de fiéis, sem ha ver um único lugar vazio.

Tia Genoveva quis sentar-se no seu banco, mas viu-o ocupado e reconheceu nessa gente todos os seus parentes, desde longo tempo mortos.

Uma de suas irmãs falecidas chegou-se perto dela e disse-lhe:

— "Olha para os lados do altar-mor, que verás teus filhos".

A desgraçada mãe viu-os em verdade: um estava dependurada numa forca; o outro jazia no chão, assassinado.

— "Vês?! Aí tens o que lhes teria acontecido, se Deus os não chamasse para si, quando estavam ainda na idade da inocência".

A centenária caiu de joelhos, rendendo graças ao Senhor.


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Pesquisa, transcrição e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)

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