3/16/2025

Mimi ou a cabrinha cinzenta ("Histórias da Baratinha"), por Figueiredo Pimentel


MIMI OU A CABRINHA CINZENTA

Em uma aldeia solitária, entre montanhas, vivia num casebre arruinado e tosco uma família pobre.

O homem lidava no campo, a mulher acompanhava-o na faina, deixando em casa a amamentar o filhinho, uma cabra cinzenta, que era o seu descanso e toda a sua fortuna.

O menino crescia, gordo, nédio, bem tratado.

A cabrinha, a boa cabrinha, que dava pelo nome de Mimi, acariciava-o, tinha para ele todos os desvelos.

Passou a primavera, passou o verão, passou o outono, chegou, enfim, o inverno. Os campos não davam sustento. Veio o tempo da cruel necessidade!

Os pobres trabalhadores voltaram para debaixo das telhas do seu casebre, por onde entrava o frio, gemendo uns soluços que lhes feriam dolorosamente o coração.

O inverno era longo e aspérrimo, e faltava-lhes tudo!

Veio um dia, então, em que nada encontraram para comer. O filhinho, pouco mamava já. A mãe sentia-se febril. O pai, desesperado, não tinha recursos para acudir à esposa, e pensava na sua triste sorte, quando viu a cabrinha adormecida a um canto.

Teve uma idéia: vendê-la! Levá-la a uma feira, trocá-la-ia pelo sustento de alguns dias.

Amarrou, pôs, uma corda ao pescoço de Mimi, que o olhava melancòlicamente, como se lhe perguntasse:

— "Que vais fazer da ama de teu filho?!"

Arrastou-a à força dali; subiu a desceu montanhas; chegou por fim, à vila, onde a vendeu a um rico lavrador.

Voltou.

A mulher melhorara, e andava louca à procura do esposo e do animal.

Contou-lhe o marido tudo que fizera.

Ouvindo-o, a infeliz, angustiada, olhava compassiva para o filhinho adormecido.

Ia se aproximando a hora em que ele costumava ter a ceia. Por isso moveu-se, chorou baixinho, à espera da sua Mimi.

Acudiu a mãe mas o pequeno, então, chorou mais e mais! Nada havia que o consolasse. Nada! O pai, aflito, cheio de remorso, arrepelava-se. A mãe, em vão, tentava sossegá-lo! Os pequeno enlouquecia, pelo excesso de choro. O vento soluçava, entrando pelas fendas das paredes rústicas.

Subitamente, ouviram ao longe um balido queixoso.

Momentos depois raspavam, batiam aflitamente à porta, que o aldeão correu a abrir de par em par.

Arfando de cansaço, a boa Mimi entrou, correndo para o menino a quem entregou a teta cheia de leite!

Coitadinha! Afrontara todos os perigos, fugira do redil do novo dono para a cabana, onde a chamava a voz dos seus amores!

No outro dia, logo de manhã cedo, foi o aldeão à vila entregar o que recebera na véspera pela cabrinha cinzenta.

O lavrador escutou-lhe a história. Viu-lhe brilhar nos olhos o arrependimento, e, comovido, estendeu-lhe a mão, pedindo-lhe para ser padrinho da criança, a quem enviou, com a bênção, uma bolsa de dinheiro.


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Pesquisa, transcrição e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)

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