O PERIGO DA FORTUNA
Jesus Cristo passeava pelo mundo,
quando foi surpreendido pela noite nas proximidades de uma aldeia.
Procurou uma casa onde pudesse
pedir pousada, mas todas as portas já estavam fechadas, as luzes extintas, e os
moradores adormecidos.
Apenas no fim de uma rua escura,
ouvia-se o barulho do pau batendo trigo. Aí brilhava uma luzinha. Nosso Senhor
dirigiu-se para lá, e bateu à porta.
Um camponês veio abrir:
— Poderá permitir que eu aqui
descanse esta noite? Não terá que se arrepender com isso.
O camponês deu-lhe abrigo, Jesus
começou a conversar:
— Toda a gente já está recolhida.
Por que motivo trabalha ainda a esta hora?
— Ah! — respondeu o camponês, — soube
ontem à tarde que ia ser processado por um credor implacável. Se lhe não pagar
amanhã o que devo, nem sei o que será de nós! Por esse motivo eu e meus filhos
pusemo-nos a trabalhar, a fim de ver se consigo solver essa dívida. Depois
disso nada mais teremos e não sei como havemos de passar o inverno. Ainda
assim, confio em Deus!
Falando dessa forma, o camponês
enxugou o suor que lhe escorria da fronte, e passou a mão pelos olhos cheios d’água.
O Senhor teve compaixão dele, e
disse-lhe:
— Não desanime, bom homem.
Pedindo-lhe hospitalidade, disse que não havia de se arrepender de me haver
concedido. Vou provar-lhe.
Segurou no lampião pendente de um
dos caibros do teto e aproximou-se da palha.
— Que está fazendo, homem? — exclamaram
receosos os trabalhadores. — Vai queimar tudo!
Mas, da palha que temiam ver
incendiada, caiu prodigiosa chuva de grãos de trigo.
Os camponeses, à vista desse
milagre, caíram de joelhos, maravilhados.
— Já que foste caridoso — falou
Jesus Cristo, — já que recebeste na tua pobreza o peregrino que te procurou,
como se fosse um pobre mendigo, recompenso-te. Foi o Senhor quem entrou em tua
casa; foi o Senhor quem te enriqueceu.
Depois Jesus Cristo desapareceu.
E a chuva de trigo não cessou de
cair durante toda a noite dentro da casa, no pátio, e no dia seguinte, formava
um monte da altura de uma igreja.
O camponês pagou as dívidas,
comprou terras e fez edificar um maravilhoso palácio.
Era rico. Tornou-se orgulhoso, mau,
e de coração empedernido para com os pobres.
Ele e seus filhos tomaram os
hábitos das pessoas opulentas, viveram com desmedido luxo, e entregaram-se a
excessos de toda a sorte, de forma que acabaram se arruinando. E como tinham
sido maus no tempo em que eram ricos, não acharam consideração nem consolo nos
dias da desgraça.
Uma noite, o velho camponês,
tendo-se embriagado, entrou na casinha que havia conservado, e lembrando-se do
milagre que o havia enriquecido, pensou que poderia renová-lo.
Tomou o lampião, aproximou a luz da
palha e incendiou-a.
O fogo tudo consumiu. Nada mais
lhes restava e morreu na miséria.
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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.
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