Guerra Junqueiro
Publicado originalmente na
revista “América Brasileira”, em edição de novembro de 1923, de autoria de
Leonardo Coimbra. Pesquisa, transcrição e atualização ortográfica de Iba
Mendes (2017)
O Poeta evolucionou. A crise não foi até erguer A luz da sua Consciência, os postulados implicados na sua interpretação da Vida.
Continuará a ser otimista, mas
o sou otimismo será agora temperado e dirigido pelo critério da evolução.
Esse critério da evolução
dar-lhe apenas o por agora, um maior contato, uma maior convivência com toda a
Natureza.
A Natureza (a Ana Tereza
de Camilo) deixa de ser onipotente em ato, para apena o ser em virtualidade a
realizar por um "incessante" esforço.
E, assim, tudo aspira e se
eleva, e, assim, uma grande humildade nos vai unir com todo o esforço
espalhado, em metafísicos pontos de ser, pelo infinito.
O deísta fez-se panteísta — o
que já foi alguma coisa
Deus passou duma abstração
vazia para um esforço imanente; a Natureza desdobrou-se, à Espinosa, em
natureza naturada e naturante.
É esse esforço criador, atração
por um Ideal, que será a verdade, de que o pensamento cristão é o símbolo nos
"Simples".
O Poeta dirá em nota final que
continua cada vez mais irredutível com o "catolicismo", mas nós bem o
vemos a aceitar o "cristianismo" como uma grande verdade simbólica:
está, portanto mais próximo a despeito dos seus próprios juízos.
"Os Simples" eis uma
obra eterna.
O Junqueiro de "Os
Simples" é o mesmo Junqueiro de eternidade, aumentado das novas luzes da
doença e da morte.
Imortal em relação aos homens,
porque será um livro lido e amado por eles, enquanto no planeta existir vida
humana.
Eterno; porque, pela sua
bondade comunicativa, pela sondagem até ao íntimo de cada alma, até ao ponto
onde começa o "outro mundo," ele atingiu a pura vida espiritual.
Quem veio esperar Junqueiro ao
porto onde desembarcam as almas?
Por certo que a Virgem das
"brancas ermedinhas" lhe mandou ao encontro os "Cavadores",
a "Moleirinha", o "Ti Zé-Senhor" e em romaria de bênçãos
grandes bandos de "Pobrezinhos"...
Sim; logo ao receber a notícia
da sua Morte se me ofereceu a visão dum Junqueiro, de bordão e sacola, a
dobrar, lá ao longe a última montanha de terra e vendo do "outro
lado" o bando de pobrezinhos que o esperam, cantando.
Junqueiro atinge aqui,
"pelo favor dos humildes", um naturalismo transcendente.
Ele pelo pensamento intelectual
é ainda um homem da Renascença; mas, pela simpatia humana e cósmica, com que se
une a todos os seres, recebe dos humildes, o amor duma Natureza, purificada
pela redenção cristã.
Aquelas romarias d'almas que
visitam as ermidas são mais presenças espirituais que meras abstrações:
artísticas.
E até as estrelas vão pelo Céu
abrindo ao som da rude flauta do Pastor.
A Natureza é outra vez edênica,
de amigo acordo com o homem, porque este homem é uma pura alma cristã.
O "Ti Zé-Senhor"
liberto das "ilusões do mundo" é, no além, um anjo branco, ainda
outra vez pastor.
Não deixaríamos "Os
Simples" se tivéssemos tempo e espaço; mas a eles voltaremos em artigo
especial.
Conclusão: "Os
Simples" é um livro eterno, não é melhor nem pior que os outros livros de
eternidade.
É a palavra humana saindo dum
coração, que "contatou" Deus.
Eis porque Junqueiro não é o
maior Poeta, porque o critério de quantidade se não aplica ao espírito, mas é
um Poeta, na alta e completa significação da palavra.
Um Poeta como Ésquilo, Dante,
Shakespeare, Camões e todos que uma onda de amor divino subiu, por momentos,
até à pura visão espiritual.
Os livros anteriores são como a
escória saída da fusão espiritualista da sua alma.
A escória sobrenadou e, por isso, foi vista primeiro; mas o líquido ia
refervendo na profundidade. E já nos livros anteriores pelos intervalos das
escorias a limpidez do líquido se tinha revelado.
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