11/24/2018

O peso (Conto), de Iba Mendes



O PESO 

Não obstante ter dormido bem toda à noite, amanheceu com a estranha sensação de estar carregando um enorme peso nas costas. Não sentia exatamente dor, mas a pressão exercida em seu corpo causava-lhe um excessivo incômodo que lhe fazia perder as forças, levando-o ao total abatimento.

Inicialmente achou tratar-se de uma simples tensão muscular ou de alguma raquialgia transitória. Numa tentativa de aliviar o desconforto, ingeriu de uma só vez dois analgésicos, e mais tarde outros e outros, porém estes não surtiram qualquer efeito, foi quando, por fim, deliberou procurar um médico.

O ortopedista examinou-o cuidadosamente e requisitou alguns exames. O resultado mostrava que tudo estava em perfeita ordem, não havendo o menor sinal de qualquer anomalia em seu organismo.

— Tem a saúde melhor que a minha, disse o doutor em tom de galhofa.

O peso, no entanto, oprimia-o de tal modo que se sentia como se estivesse transportando um volumoso pedaço de ferro ou uma grande pedra em toda a região posterior das costas.

— É coisa de sua cabeça, diziam os amigos, numa tentativa de confortá-lo e, quem sabe, arrancar-lhe de seu espírito as preocupações. O método, no entanto, não funcionou e o homem continuava levando nas costas um peso maior que suas forças.

Recorreu então à medicina alternativa, fazendo uso dos florais de Bach, da magnetoterapia, da homeopatia, da naturopatia, entre muitos outros tratamentos disponíveis no mercado, os quais, em vez de aliviar o transtorno, fazia aumentar ainda mais seu desespero.

Tentou ainda a psiquiatria, que buscou curá-lo por meio da prescrição de poderosos sedativos e ansiolíticos. Seguiu assim à risca todos os procedimentos médicos, e, após inúmeras sessões no divã, não logrou qualquer resultado prático.

Decepcionado com as medicinas e com os médicos recorreu então aos templos religiosos, aos terreiros de umbanda, aos despachos nas encruzilhadas, às orações de fé e às cirurgias espirituais; fez ainda promessas aos santos e até se entregou ao martírio do corpo, numa busca desesperada para se livrar do enorme peso nas costas.

Tudo em vão! o peso continuava a subir-lhe na espinha, desde as espáduas até os rins e seguia-o para onde quer que fosse... Tornou-se, pois, parte do seu próprio corpo e se conformou com ele.

Naquela mesma noite deitou despreocupado e dormiu como uma pedra. Ao acordar notou que o peso tinha se esvaído por inteiro de suas costas e que estava livre daquele corpo invisível e opressor. Sentiu-se estranho... e desesperou-se.

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