11/25/2018

O velho (Conto), de Iba Mendes



O VELHO 

Conta-se que certo moço, no esplendor de sua juventude, estava enfastiado de sua mocidade e nutria de compulsiva inveja dos anciões de avançada idade. Por onde passava dizia que os instantes de maior felicidade em sua vida eram aqueles em que se imaginava velho e de barbas longas e brancas. Por isso, nunca era visto entre os de sua idade ou fazendo aquilo que normalmente fazem os jovens. Ao contrário, gostava de frequentar os lugares próprios para os velhos e se divertir junto com eles nos salões de festas, nos bancos das praças e em outros ambientes próprios a essa idade.

Com o decorrer dos anos, esse seu surpreendente apreço pelo senil, levou-o a adquirir hábitos que se tornaram bizarros aos olhos de quase toda a cidade, e inaceitáveis para os mais íntimos. Passou a vestir-se à maneira dos idosos, a andar de bengala e um tanto giboso como eles; deixou a barba crescer e começou a se interessar por filosofia e literatura antiga.

Alguns acreditavam que tinha perdido o juízo e que deveria ser mandado para um manicômio. "Ou lançado ao asilo", diziam outros com sarcástica ironia. Quantos aos próprios velhos, as opiniões entre eles divergiam. Havia aqueles que viam os gestos do moço como um exemplo inspirador de veneração e respeito, e que, por seus próprios méritos, mereciam ser compreendidos e imitados por todos os outros de sua idade; a maioria, no entanto, seguia pelo mesmo bojo da multidão, que o tomava como estúpido e alienado.

O tempo, entretanto, mostrou que o excêntrico modo de agir do mancebo não indicava qualquer sinal de demência ou alienação. Em vez disso, tornavam-no cada vez mais gentil e benevolente para com todos, especialmente com os de mais idade, e de tal modo que conquistou a simpatia e o respeito de todos eles.

Mas esse mesmo tempo, como bem disse outro bom velho, é um rato roedor das coisas, que as diminui ou altera no sentido de lhes dar outro aspecto. E foi assim que envelheceu o nosso jovem.

Aos setenta anos, sentia-se cansado e saudoso dos velhos anos que não podiam voltar mais. A velhice o havia surpreendido e agora amava a juventude como nunca havia amado antes. Amava e desejava o que não podia ter.

Com o avançar da idade, ficou desgostoso e passou a imitar os moços, a querer ser novamente jovem. Fez a barba e tentou, em vão, livrar-se da bengala. Esforçava-se para mostrar que podia fazer as mesmas proezas dos velhos tempos, e muitas vezes teve de ser amparado, em praça pública, ante os escárnios dos mancebos e das donzelas. Alardeava aos quatro ventos que odiava a velhice e maldizia as cãs embranquecidas. Sofria assim o ridículo de sua própria decrepitude mental e física.

Em certo dia de sol, ele descansava de sua velhice debaixo de uma frondosa e refrescante árvore, quando um moço, na áurea de sua juventude, que por ali passava, ouviu-o murmurar algumas palavras confusas e tristes. O rapaz então se aproximou dele e perguntou-lhe se estava se sentindo bem, se precisava de alguma coisa, se queria conversar, enfim... O idoso ergueu-se cambaleando, acercou-lhe e o abraçou tão fortemente que parecia sentir nele a sua própria alma: eterna e jovem.

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