A PARÓDIA
Os três cadáveres
(Paródia de "As Três Irmãs", de Luís Delfino)
(Paródia de "As Três Irmãs", de Luís Delfino)
O mais gordo dos
três, de ventre nédio, informe,
O que me desatina
Quando, no fim do mês,
me manda a conta enorme,
É o vendeiro da
esquina.
O segundo, que tem o
aspecto de um meirinho
Quando à porta me
bate.
É o azar, que a
tremer, deparo em meu caminho
É o meu alfaiate.
O outro é o homem
fatal que o viver encrencado
Me faz negro e
sombrio;
Entre todos feroz, é
o algoz desalmado,
É o meu senhorio.
O mais gordo dos três,
cobra... "constritor boa",
Cujo veneno afronto,
Mio compreende bem,
nem releva ou perdoa
Minha disga de "pronto".
O segundo é o credor
de feia catadura
Atrevido, arrogante;
Não sabe olhar em mim
mais que o corte e a "fatura"...
Do meu fato elegante.
O terceiro é o algoz:
- hidra, monstro o, pantera,
Ameaça intimidação!
Terno-o: No fim do mês,
quando surge essa fera
Não a conheço não!
Se o primeiro falisse.
— ó ditosa ocorrência!
Eu, de aliaria tonto,
Correria a ajudar os juízes
da falência
Com o meu ódio de "pronto".
Se o segundo falisse,
eu mesmo iria a juízo
Contra o bicho depor!
Dir-lhe-ia: — O Diabo
aumente ainda mais teu prejuízo
Desgraçado credor!
Se o terceiro falisse
— ó que felicidade!
— O mais feroz do lote,
—
Com toda a correção,
com toda probidade,
Passava-lhe o calote!
Se o primeiro
morresse, — ó como eu gostaria
Tão completa ventura!
As "contas"
por pagar rezava-as noite e dia
Na sua sepultura...
Se o segundo morresse
— ó meu prazer eterno
Que num sonho diviso!
Ele iria rodando às
profundas do inferno
Nas rodas do meu riso.
Se o terceiro
morresse, uns sete pés cavados
No chão, em paz
teria;
E eu, na casa do
bruto, aluguéis atrasados
Jamais os pagaria!
D. XIQUOTE
Revista "Careta", 1917.
Revista "Careta", 1917.
---
O ORIGINAL
As três irmãs
C'erano tre zitelle,
E tutti tre d’amore.
(Canto popular da
Itália)
I
A mais moça das três,
a mais ardente e viva,
Aquela que mais
brilha,
Quando, sorrindo, aos
seus encantos nos cativa,
Eu amo como filha.
A segunda, que tem da
pálida açucena
Aberta, de manhã,
A cor, o cheiro, a
forma, a languidez serena,
Eu amo como irmã.
A outra é a mulher,
que me enleia e fascina,
É a mulher que eu
chamo
Entre todas gentil: é
a mulher divina,
É a mulher que eu amo.
II
A mais moça das três
é linda borboleta;
Entra, abre as asas,
sai:
Não compreende bem,
não nega, nem rejeita
O meu amor de pai.
A segunda é a flor de
essência melindrosa,
De rara perfeição;
Não sei se ela
desdenha ou se ela entende, e goza
O meu amor de irmão.
A terceira é a
mulher: anjo, monstro, hidra, esfinge,
Encanto, sedução;
Amo-a; não a conheço:
é verdadeira, ou finge?
Não a conheço, não.
III
Se a primeira
casasse, oh! que alegria a minha!
Eu lhe diria: Vai!
Veria nela um anjo,
um astro, uma rainha
O meu amor de pai.
Se a segunda casasse,
eu mesmo iria à igreja,
Levá-la pela mão:
Dir-lhe-ia: o céu
azul virar-te aos pés deseja
O meu amor de irmão.
Se a terceira
casasse, oh! minha infelicidade!
A mais velha das
três,
No horror da
escuridão, fora uma eternidade
A minha viuvez.
IV
Se a primeira
morresse, oh! como eu choraria
A minha desventura!
Com lágrimas de dor
lavara, noite e dia,
A sua sepultura.
Se a segunda
morresse, oh! transe amargurado!
Eu choraria tanto
Que ela iria boiando,
em seu caixão doirado,
Nas águas do meu
pranto.
Se a terceira
morresse, em seu caixão deitada,
Sem que eu chorasse,
iria,
Porque noutro caixão,
ó minha morta amada,
Alguém te seguiria...
LUÍS DELFINO
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sugestão, críticas e outras coisas...