

A árvore que despencou no chão
Era uma vez
uma árvore frondosa, imponente e repleta de grandes e viçosos galhos. Todo
aquele a quem era reservado a felicidade de vê-la e admirá-la, ficava como que extático
e assombrado, tamanha era sua beleza e exuberância. Por isso ela atraía a
atenção de pessoas do mundo todo, sendo assunto desde os ébrios nos botequins
até os doutos e mestres nos grandes centros universitários. Havia nela, por
assim dizer, um certo encantamento que a tornava uma árvore verdadeiramente
única, ímpar e sem igual em toda face da terra.
E toda essa
singularidade residia no fato de seus galhos serem magistralmente compostos por
uma infinidade de seres vivos, todos amalgamados por uma rígida e compassada
inter-relação, numa progressiva evolução rumo à suprema perfeição natural, onde
residia a copa mais verdejante. Nos galhos de baixo achavam-se os vermes, sendo
por isso considerados os seres menos dignos de todo o arbusto; a seguir vinham
os répteis, depois as aves, os mamíferos e, por fim, no seu mais alto cume,
aparecia ostentosamente o homem, a obra máxima da Seleção Natural.
Na medida em
que o tempo passava intensificava-se o respeito e o apreço pelo insigne
vegetal. Quem, por negligência ou ignorância ousava contestar sua relevância
para o bem da humanidade, era de imediato silenciado ou forçado a reexaminar
sua postura anátema, sob pena de prisão e tortura.
— Hereges
malditos! —vociferavam indignados seus audaciosos defensores. — Como ousam
questionar o inquestionável? — indagavam inconformados com tão grande blasfêmia.
Mas as
árvores, tais quais os homens e as flores, também envelhecem. Assim se deu com
a nossa ostentosa árvore. Os vestígios do tempo tornaram-na árida e quebradiça.
Ademais, alguns mais ousados, que traziam em si certa desconfiança, resolveram,
na calada da noite, investigar mais de perto o que de fato se passava com
aquele majestoso vegetal. Essas inquirições tornaram-se frequentes e, aos
poucos, descobriu-se que muitos dos seus galhos foram ali implantados mediante
artifícios humanos, e não como consequência da ação invisível e aleatória da
Natureza, como apregoava a unanimidade acadêmica nos quadrantes da terra.
Entretanto, o temor das ameaças falou mais alto, e o silêncio tornou-se a
regra.
O tempo,
todavia, não cessava sua marcha...
Foi então que
num belo dia, num desses dias em que o sol parece brincar de rei, que a árvore,
pela primeira e única vez balançou desde a sua base. Tal acontecimento veio
seguido de enorme comoção mundial, e a notícia se espalhou como um impetuoso
vento pela face da terra. Milhares de pessoas vieram então vê-la, quiçá, pela
última vez. Ao seu redor uma multidão de repórteres lançava aos lares a
chocante imagem da ingente árvore a mover-se de um lado para o outro. De
repente, num diminuto lapso de tempo, eis que o lenhoso vegetal despenca e,
como água de cachoeira, desfalece no chão ante o assombro de toda a humanidade.
Houve choros e
lamentações, e alguns até se lançaram em precipícios em profundo desespero. Mas
que se havia de fazer? A grande Árvore estava por fim inerte ao chão.
Logo vieram os
especialistas, os quais, munidos das mais avançadas técnicas e equipamentos,
tentavam desvendar a causa de o poderoso vegetal ter capitulado. As conclusões
foram rápidas e sucintas:
A árvore era
uma grande farsa, e os seres que a adornavam nada mais eram do que produtos da
astuta ação de certo naturalista, o qual, impelido pelo desejo de ver sua
teoria estabelecida, conseguiu a proeza de torná-la uma realidade concreta e
inquestionável, não obstante seu verdadeiro aspecto de imenso fantasma.
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