O GRANDE CARIMBAMBA
Era
o curandeiro mais afamado e respeitado de toda aquela redondeza; considerado
por muitos como um homem a quem os céus privilegiaram com o dom da cura e dos
prodígios. Dizia-se que até paralíticos ele fez andar. Atribuíam-lhe ainda outras
proezas, tais como a de trazer os maridos de volta ou, caso necessário, a de
mandá-los para os diabos.
Além
de lhe render fama e muito prestígio, seus milagres acrescentaram-lhe também
uma excelente fortuna, não obstante exteriorizasse a simplicidade de um
Francisco de Assis ou a pobreza de uma Madre Teresa de Calcutá.
Ausentava-se
dos necessitados uma vez por ano durante trinta dias, quando fazia uma
prolongada viagem, geralmente para Las Vegas nos Estados Unidos. Não era isso,
porém, que fazia constar no aviso à porta da famosa “Tenda dos Milagres”,
também denominada de o “Pronto-Socorro da Fé”. Alertava-se ali “que o
curandeiro partiria para um retiro espiritual nos lugares santos, e que logo
retornaria com muito mais unção para trazer alívio aos sofredores”.
Alguns,
porém, os mais céticos, chegaram a duvidar dos poderes miraculosos do grande
curandeiro. Dentre estes, um próspero fazendeiro dado aos estudos de filosofia
e das enciclopédias. Lançou o homem um desafio ao poderoso carimbamba. Dava-lhe
a escritura lavrada de todas as suas propriedades caso ele fizesse crescer a
perna amputada do velho mendigo da praça.
Entretanto
o feitiço voltou-se contra o feiticeiro. Dias depois o rico proprietário de
terras fora alvejado com três tiros na perna esquerda, cuja consequência imediata
foi sua irreversível amputação.
A
notícia espalhou-se como a força dos furacões pelos arredores. “Não se pode
zombar do homem de Deus”, afirmavam alguns mais fervorosos; “foi castigo dos
céus”, diziam outros em tom admoestatório e provocativo.
O
episódio fez acrescer ainda mais a influência e o prestígio do grande
feiticeiro. O jornal da cidade anunciou a chegada de alguns estrangeiros
oriundos do Equador e da Venezuela, os quais peregrinavam por essas bandas em
busca de cura para suas moléstias. O prefeito aproveitou-se da ocasião para
tirar também vantagens dos prodígios do milagreiro. Mandou erigir uma enorme
estátua de bronze em honra ao “GRANDE CARIMBAMBA”, o que lhe rendeu grande
popularidade e até o inesperado apoio da oposição.
Era
um dia como outro qualquer, quando as ruas amanheceram em alvoroço, por causa
de um anúncio afixado na porta da “Tenda dos Milagres”, o qual, em caracteres
destacados com letras rubras, convocava a atenção pública para um evento ali
denominado de “O Grande Dia dos Milagres”, a ser realizado na grande praça da
cidade dali a um mês. As rádios e os jornais da região se incumbiram de
espalhar a notícia e de alardear os feitos do grande homem. Esperavam-se
grandes caravanas, inclusive com a chegada de devotos de outros países, alguns
dos quais oriundos da Europa e da Ásia.
Era
feriado nacional. A praça estava completamente tomada de um extremo a outro.
Pessoas em cadeiras de rodas, algumas deitadas em colchões e outras com muletas
aglomeram-se ao redor do palco. A ansiedade e o cansaço mesclavam-se nos rostos
cheios de angústia e esperança.
A
chegada do milagreiro veio acompanhada de um pequeno tumulto, logo contido por
uma bateria eufórica de aplausos e estridentes gritos de “viva o grande
carimbamba!”.
Após
o longo sermão, o curandeiro convida os enfermos para fazer “a poderosa oração
da fé”. A multidão em delírio ergue as mãos para os céus. “É chegado o momento
da libertação”, vocifera entusiasmado o pregador. Tem-se início a ansiada
prece. A comoção é geral. Alguns doentes choram. Um paralítico tenta erguer-se
da cadeira de rodas. Há desmaios e histerias. De súbito o curandeiro gira-se
violentamente no meio do palco. Notam-se contrações musculares em todo o seu
corpo. Os olhos parecem sair-lhes das órbitas. Uma espuma branca corre-lhe pela
boca, cujos dentes ficam firmemente cerrados. Em seguida tomba no tabulado e morre
ante os olhos assombrados da multidão.
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