9/29/2019

Vida e obra do Barão do Rio Branco



Vida e obra do Barão do Rio Branco

A obra de Rio Branco não é daquelas que se possam sintetizar num mero artigo, mas, por outro, possui ela índices tão significativos, que são suficientes para mostrar a sua magnitude e importância. A herança de um grande homem, como o seu pai, primeiro Rio Branco — cujo governo foi no antigo regime, o mais progressista do país, além da sua benemerência no esforço nacional pela extinção do elemento servil e da sua considerável atuação diplomática — pôde o Barão do Rio Branco cercar de extraordinário fulgor, pelo muito que fez, igualando, ultrapassando porventura o insigne Visconde.

Grande advogado e grande diplomata, Rio Branco logrou conciliar, de forma surpreendente, essas qualidades, alargadas pelo tino de estadista e fortalecidas pelo conhecimento minucioso e seguro da geografia e da história do seu país. Cultor apaixonado desses estudos, desde muito moço, foi neles que encontrou as razões e os argumentos com que, mais tarde, em pleitos memoráveis ou em gestões diplomáticas, defenderia os direitos do Brasil a integrar seu território, nos limites até onde o esforço nacional se estendera. E, para isso, o uti possidetis era a prova iniludível, tendo Rio Branco, de uma forma erudita, minuciosa e exaustiva, demonstrando sempre a razão de nossas pretensões, sob esse acertado critério jurídico, vencendo e convencendo da maneira mais ampla e mais completa.

Depois dos feitos famosos de Missões e do Amapá, pelos quais acresceu o território nacional com 30.621 e 255.000 quilômetros quadrados, respectivamente, nos quais Rio Branco se revelou um advogado extraordinário, na Chancelaria do Brasil iria, como diplomata arguto e firme, concluir novos tratados de limites, com a Bolívia, incorporando o Acre, com

152.000 quilômetros quadrados e com o Peru, reintegrando no país 251.000 quilômetros quadrados, que aquela república vizinha reclamava. É preciso, porém, que se afirme que os 688.621 quilômetros quadrados, que Rio Branco conseguiu, não foram tirados de qualquer país irmão, mas as suas vitórias reintegraram o território brasileiro com todas essas extensões, em disputa, mas que Rio Branco demonstrou serem plena e absoluta propriedade do Brasil. Ele foi o servidor constante do direito, tanto que, por vezes, fez concessões para favorecer os países limítrofes e concluiu o tratado da Lagoa Mirim e do Rio Jaguarão, um ato de justiça, pelo qual, sem qualquer solicitação, reciprocidade ou compensação, o Brasil concedeu à República Oriental do Uruguai o condomínio da lagoa e rio mencionados.

Esse é o grande aspecto que avulta na obra de Rio Branco, nume tutelar da Pátria e Deus terminus da sua integridade, na frase consagradora de Rui Barbosa. No entanto, a atividade do benemérito brasileiro não se circunscreveu a esse esforço, que bastaria para a glorificação do seu nome. A sua passagem pelo Itamarati, em dez anos de labor, cercou a nossa chancelaria de uma fulgente auréola. O cardinalato, a 3ª Conferência Internacional Americana, a 2ª Conferência da Paz, na Haia, tratados, visitas de homens ilustres ao Brasil e outros acontecimentos constituem provas significativas da sua grande gestão no Itamarati. Mas ela foi marcada sobretudo pelas diretivas que Rio Branco traçou à política Internacional do Brasil. A ele devemos a reafirmação de solidariedade com os Estados Unidos da América, como elemento tradicional da nossa diplomacia; de arbitragem, como solução pacífica das diferenças internacionais; do pan-americanismo, como destino do engrandecimento deste hemisfério; da paz como ideal de coordenação e cooperação entre os povos. A sua escola diplomática, da mesma forma que a dos grandes próceres americanos, deveria produzir os frutos magníficos desta hora, quando a América se uniu infrangivelmente para repelir a agressão e salvar a liberdade. A vitória, que estamos prestes a celebrar, é também obra de Rio Branco, no sentido de que a posição brasileira podemos estar seguro — foi aquela em que nos teria colocado o grande chanceler, foi a que seguiu a sua diretiva, a que realizou seus ensinamentos e foi a da coerência com seus princípios.

O Barão do Rio Branco é, assim uma das nossas glórias mais puras e mais legítimas... Evoquemos, pois, a glória de Rio Branco, o seu patriotismo, o seu fervoroso amor à nossa terra que ele aumentou, à nossa gente que ele dignificou, o seu desinteresse, a sua confiança inabalável na grandeza da Pátria.

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A figura do grande chanceler está profundamente ligada à história da diplomacia brasileira. Graças à sua erudição, cultura, inteligência, tato e entusiasmo — o Brasil resolveu os casos mais graves da sua política exterior, no período republicano. Rio Branco, além disto, traçou as diretrizes fundamentais da política exterior do nosso país, durante a sua Iuminosa gestão no Itamarati.

Filho de um dos maiores estadistas do Império — o Visconde do Rio Branco, que também foi um notável diplomata — nasceu ele no Rio de Janeiro, a 20 de abril de 1845.

Iniciou o curso de direito na Faculdade do Recife, mas foi terminá-lo em São Paulo, onde deixou — além de uma auréola de boêmia — a tradição de sua seriedade nos estudos e ativa participação nos movimentos literários e políticos da época. Uma vez formado, seguiu para a Europa, em viagem de aperfeiçoamento. Regressando ao Brasil, lecionou, durante certo tempo, Corografia e História, no Colégio Pedro II. Quando o Visconde do Rio Branco seguiu para o Paraguai, depois da guerra, em importante missão do governo imperial, o Barão do Rio Branco o acompanhou como seu secretário.

Foi deputado geral pelo Estado de Mato Grosso, sendo, na mesma época, redator de a "Nação".

Em 1876, foi nomeado cônsul geral do Brasil, em Liverpool, onde se aprofundou nos seus estudos de história e geografia do nosso país.

Publicou por esse tempo uma tradução anotada da História da Tríplice Aliança, de Schneider, a "Esquisse de Histoire du Brésil", uma biografia de D. Pedro II, além de artigos.

Preparou, durante muito tempo, uma história Militar do Brasil.

Quando faleceu o Barão de Aguiar, em Washington, foi nomeado para o substituir na chefia da missão especial encarregada de defender os direitos do Brasil na questão de limites com a República da Argentina, submetido pelos dois países à arbitragem do presidente Cleveland. Com suas demonstrações irrefutáveis apresentadas na notável Memória Brasileira, o Barão do Rio Branco, levou ao árbitro a convicção de que era brasileiro o território em disputa. E assim, em 5 de fevereiro de 1895, 30.662 quilômetros quadrados do território litigioso eram definitivamente incorporados ao território do Brasil.

Novos triunfos obteve, mais tarde, o Barão do Rio Branco nas questões de limites com a Guiana Francesa.

O Congresso Nacional declarou-o benemérito, votando uma pensão anual para ele e seus filhos.

Quando servia como ministro do Brasil, em Berlim, o presidente Rodrigues Alves, em 1902, convidou-o para a pasta das Relações Exteriores. Nesse posto prestou novos e relevantes serviços ao Brasil, liquidando, então, de maneira admirável, a questão do Acre, aumentando, mediante compensações, em dinheiro e em território, a superfície do Brasil em cerca de 200.000 quilômetros quadrados.

Assinala-se, ainda, pela conclusão das questões de limites com o Peru e o Uruguai e pela medida profundamente simpática, reconhecendo à República Oriental do Uruguai o direito ao condomínio das águas da Lagoa Mirim e Rio Jaguarão.

Foi conservado na pasta das Relações Exteriores nos governos de Afonso Pena, Nilo Peçanha e Marechal Hermes da Fonseca.

Rio Branco faleceu nesta capital no dia 10 de fevereiro de 1912.

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"A Manhã", 20 de abril de 1945.
Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)

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