A MENINA DA CAPINHA VERMELHA
Era uma vez uma menina boazinha,
apreciada por todos e principalmente por sua avó, que já não sabia o que fazer
para agradá-la. Deu-lhe muitas coisas bonitas e entre elas uma capinha de
veludo vermelho que a menina começou a usar todos os dias. Daí lhe veio o nome
de Capinha Vermelha.
Certa noite a mamãe chamou-a e
disse:
— Capinha, recebi recado que vovó
está adoentada. Amanhã bem cedo vista-se e vá levar lá este pão-de-ló e esta
garrafa de vinho. Mas não corra, que cai e quebra a garrafa. Também não se
esqueça, quando entrar no quarto de vovó, de lhe dar bom dia. Nem se ponha a
reinar muito, que a incomoda, ouviu?
— Sim, mamãe, farei tudo direitinho
como a senhora quer — respondeu a boa menina.
A vovó morava na floresta, um pouco
longe da vila. No dia seguinte, bem cedo, Capinha pulou da cama, vestiu-se e lá
se foi, com o doce e o vinho numa cesta. Ao atravessar a floresta encontrou um
lobo de cara muito feia.
— Bom dia, Capinha! disse o lobo.
— Bom dia, senhor bicho! respondeu
ela.
— Para onde vais tão cedo e com
tanta pressa?
— Vou a casa de vovó, que está
adoentada.
— E que levas na cesta?
— Um pão-de-ló e uma garrafa de
vinho.
— E onde mora tua vovó?
— Lá longe, a um quarto de hora
daqui, numa casinha que tem dois carvalhos na frente e três pereiras dum lado.
O lobo, que estava com fome, teve
vontade de comer as duas, a avó e a neta, apesar de que carne de
velha não é petisco de que lobo
goste. Bom apenas para encher a barriga; depois comeria a menina como
sobremesa.
— Capinha Vermelha, disse o lobo,
veja quanta flor bonita há por aqui e como os passarinhos estão
cantando alegres esta manhã. Você
vai tão ligeira que nem repara nestas lindas coisas.
O que ele queria era que a menina
se distraísse pelo caminho e lhe desse tempo de correr à casa da
velha e comê-la antes que Capinha
chegasse.
A menina olhou em volta de si e viu
realmente muitas flores que brincavam com os raios de sol;
também notou que todos os
passarinhos estavam cantando. E teve uma idéia.
— Vou levar para a vovó um lindo
buquê de flores do campo, disse consigo. Ida é muito cedo. Tenho tempo de
sobra.
Assim pensou e assim fez. Começou a
colher florinhas silvestres, uma aqui e outra lá, para reunir um grande buquê.
Enquanto isso o lobo foi correndo em procura da casa que tinha dois carvalhos
na frente. Encontrou-a, viu que tinha também três pereiras ao lado e, certo de
que era ali mesmo, bateu: toque, toque,
toque.
— Quem é? perguntou lá de dentro a
velha.
— Sou eu, Capinha Vermelha, vovó!
Trago um presente para a senhora, disse o lobo, imitando a voz da menina.
— Erga a tranca e entre, respondeu
a velha com voz fraca. Estou na cama e sem ânimo de me levantar.
Sem esperar por mais, o lobo ergueu
a tranca da porta e entrou e avançou para a velha e a devorou num instante.
Depois vestiu-se com a roupa dela, pôs a sua touca na cabeça e deitou-se na
cama, cobrindo-se com o cobertor.
Enquanto isso Capinha andava dum
lado para outro na mata, colhendo flores silvestres, até que formou um grande
buquê. Por fim disparou na carreira até à casa dos dois carvalhos. Ao dar com a
porta aberta ficou muito admirada, pois era a primeira vez que isso acontecia.
Mas entrou, embora um tanto desconfiada.
— Bom dia, vovó! Disse ela ao ver o
vulto de sua avó na cama, que ficava num quarto meio escuro.
— Bom dia, minha neta! Respondeu o
vulto numa voz esquisita.
A menina estranhou aquela voz e,
prestando mais atenção, estranhou também o jeito de sua avó, cujas orelhas
haviam crescido muito.
— Que orelhas tão grandes são
essas, vovó? Perguntou a menina, espantada.
— São para melhor te ouvir, minha
neta!
— E que olhos tão arregalados são
esses, vovó?
— São para melhor te ver, minha
neta.
— E que mãos tão peludas, vovó?
— São para te acariciar, minha
neta.
— E que dentes tamanhos, vovó?
— São para melhor te devorar!
Respondeu o lobo, saltando da cama sobre a menina e devorando-a com cesta e
tudo.
O lobo havia comido a velha e a
menina com intervalo de minutos, de modo que se sentiu pesado e sonolento como
uma jibóia. Voltou para a cama e ferrou logo no sono, roncando alto de se ouvir
longe.
Um lenhador, que estava a cortar
lenha ali por perto, ouviu os roncos. Estranhou aquilo. Largou do trabalho para
ir ver o que era. Dando cm o lobo a dormir na cama da velha, ficou muito
admirado, porque se tratava de um lobo que todos os moradores daquelas redondezas
viviam perseguindo sem nunca o poderem pilhar. Caminhou para ele na ponta dos
pés e, de repente, zás! matou-o com
três ou quatro valentes machadadas.
Esta história é muito triste mas
bem pode ser que as coisas não se tenham passado exatamente assim.
Um homem que morava perto, e
portanto devia saber das coisas melhor que os que moravam longe, contou, mais
tarde, que tudo aconteceu dum modo muito diferente.
Disse que quando o lobo encontrou a
menina na floresta e pôs-se a conversar, ela não respondeu uma só palavra e foi
andando seu caminho sem nem olhar dos lados. E que assim que chegou à casa da vovó
contou-lhe o seu encontro com o lobo.
— Vamos fechar, bem fechada, a
porta, disse a velha, porque o maldito deve estar em caminho para cá.
O que ele quer é nos comer.
Fecharam, bem fechada a porta e
ficaram à escuta, muito quietas. Logo depois o lobo chegou; e certo de que
havia vindo primeiro que a menina, bateu, dizendo com voz disfarçada:
— Sou eu, a menina da Capinha
Vermelha, que vem trazer para sua vovó um doce e uma garrafa de vinho.
Mas as duas, encolhidas lá num
canto, não responderam coisas nenhuma. Era o mesmo que não existirem.
Danado da vida, o lobo trepou e
ficou à espera de que a menina saísse para a devorar. A velha, então, resolveu
pregar-lhe uma peça de bom tamanho. Para isso encheu m grande caldeirão com
água que pôs a ferver no fogo, com um pedaço de carne dentro. Quando a sopa
ficou no ponto, ela entreabriu a porta e botou o caldeirão para fora. Assim que
o vapor e o cheiro da carne chegaram ao telhado, o lobo, que estava morrendo de
fome, não pôde resistir e espichou a cabeça para espiar o que era. Nisto escorregou
do telhado e caiu com a cabeça dentro do caldeirão fervendo. Morreu cozido! E
assim, graças à astúcia da velha, Capinha pôde voltar para casa, muito alegre,
sem que nada houvesse acontecido, nem a ela nem à sua querida vovó.
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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2025)
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