5/03/2025

A Bela Adormecida no bosque (Conto), de Figueiredo Pimentel


A BELA ADORMECIDA NO BOSQUE

O imperador dos turcos, Tamerlão I, e a rainha, sua mulher, desesperavam-se por não ter filhos. Já estavam de todo sem esperança, quando veio ao mundo uma interessante filhinha.

Foi indizível a alegria dos pais, e decretaram-se festejos pomposos para celebrar o nascimento da pequenina, e o seu batizado, dias depois.

As fadas do país foram convidadas para a festa; mas, por esquecimento, ou pela pouca importância que lhe davam, esqueceram de mandar convite a uma delas, feia velha.

No dia do batizado compareceram todas, e vaticinaram à jovem Íris todas as felicidades, desejando-lhe formosura, beleza, fortuna, bondade, talento, e um noivo rico.

Quando a última acabou de falar, apareceu à velha fada, que exclamou:

— A boda e o batizado não vá sem ser convidado... Mas eu vim, porque também quero fazer o meu presente à jovem Íris. Desejo que, quando chegar à idade de dezesseis anos, pique a mão num fuso, do que morrerá.

Ficaram todos consternadíssimos com tal profecia.

Uma fada, porém, que já conhecia quanto era perversa a sua má companheira, e imaginando que seria capaz de alguma partida, havia se escondido, e surgiu depois dela:

— Falo eu ainda, que nada ofereci à princesa. Não tenho poder para destruir completamente o mau agouro da minha colega, mas posso modificá-lo. Íris não morrerá, mas há de adormecer durante cem anos, até que um príncipe jovem e formoso, venha despertá-la, casando-se com ela.

Tamerlão I baixou imediatamente um decreto, proibindo, sob pena de morte, o uso da roca e do fuso.

Íris cresceu, cheia de bondade, formosíssima, espirituosa e querida de todos.

Um dia, porém, quando já havia feito dezesseis anos, andando a passear pelo campo, entrou numa choupana habitada por uma velhinha, que se achava fiando, por ignorar o édito imperial.

Curiosa daquilo que nunca tinha visto, pediu para ver um fuso, e, sem jeito nenhum, picou-se no dedo. Caiu para trás desfalecida.

O rei lembrou-se da profecia, e vendo que todos os esforços e cuidados eram inúteis para despertá-la, mandou que a transportassem para o palácio.

A boa fada, que destruiu em parte o encanto da velha bruxa, apareceu. Preveniu que, devendo ela dormir um século, ao despertar ficaria triste, não conhecendo mais ninguém.

Usando do seu poder, transformou fidalgos, lacaios e criados, o rei e a rainha, em estátuas de mármore.

Em torno do palácio cresceu um matagal tão espesso, tão cerrado, que o majestoso edifício não podia ser visto da estrada.

***

Decorreram cem anos.

Íris continuava a dormir, conservando sempre as mesmas faces cor de rosa, lábios vermelhos e cabelos louros.

Um dia o filho de um rei, que então governava os turcos, andando a caçar, avistou casualmente no meio do bosque, as elevadas torres do palácio.

Perguntou o que era, e ninguém sabendo informar, embrenhou-se com afoiteza pela floresta, cujos ramos se abriram para deixá-lo passar.

Avistou o palácio, que se conservava no mesmo estado, e ficou estupefato perante a beleza do que via, admirando-se das estátuas de mármore — umas sentadas, outras deitadas, em atitude de conversa, algumas.

Entrou pelas salas adentro, e, quando chegou ao quarto da princesinha, ficou deslumbrado.

Assim que se aproximou, a formosa jovem falou-lhe muito naturalmente:

— Tardaste tanto, príncipe! Há muito que te esperava.

Havia terminado o encanto.

Todo o palácio acordou daquele longo sono de cem anos.

Tamerlão e sua mulher, que julgavam ter sabido do desmaio da filha poucos minutos antes, ficaram admirados vendo-a conversar com um estrangeiro, vestido inteiramente fora da moda que não conheciam.

Mas a boa fada apareceu e explicou o que se havia passado.

O casamento de Íris com o príncipe Heitor efetuou-se um mês depois, com um brilhantismo que hoje não existe, nem mesmo nos países do Oriente.


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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.
 

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