O vasto e soberbo castelo de
Kinast, na Boêmia, atualmente em ruínas, vivia outrora Leona, uma jovem
duquesa, de extraordinária formosura, única herdeira de nobre e rica família.
Era bela, mas tinha o coração
empedernido e era orgulhosa em extremo.
Depois da morte do pai, os velhos e
fiéis servidores do castelo pediram-lhe que escolhesse um esposo.
A moça levou-os à beira de um
abismo, no cume de um rochedo escarpado, onde o homem mais valente não chegava
senão tremendo, e disse-lhes:
— Se houver alguma pessoa que
queira desposar-me, é preciso que suba a cavalo até este cimo pontiagudo. Juro,
por tudo quanto há de mais santo, que somente aquele que o conseguir terá
direito de me chamar sua esposa.
Muitos cavalheiros aventuraram-se
àquela empresa, mas todos sucumbiram. Uns, corriam, seduzidos pela beleza de
Leona, outros levados pela ambição, outros arrastados por um sentimento de louco
orgulho. E a impiedosa castelã, com a mesma indiferença, viu perecer os que a
amavam, sinceramente, os que só aspiravam a compartilhar de sua fortuna.
Um dia três novos cavalheiros
quiseram fazer a mesma tentativa. Eram três filhos de uma família poderosa — jovens,
belos, valentes.. Atraíam todos os olhares, e as preces da multidão os
seguiram.
Um, após outro, tentaram subir o
fatal rochedo. O primeiro não chegara a meio do caminho, quando o animal deu um
passo em falso, e precipitou-se no abismo; o segundo também; o terceiro
adiantou-se com mais precauções; e já havia transposto os principais obstáculos
e aproximava-se do cimo, quando, de repente, uma planta úmida fê-lo resvalar, e
rolou de penhasco em penhasco até o fundo do medonho sorvedouro.
Perante aquele horrível espetáculo
a multidão soltou um grito de dor. A própria Leona sentiu-se comovida, mas bem
depressa retomou a sua soberba indiferença, e olhou sem um único estremecimento
de coração, os corpos esfacelados daqueles que o aspecto da montanha
sanguinolenta não havia amedrontado.
Uma manhã o som do trompa anunciou
a chegada de um estrangeiro. Um cavalheiro entrou no castelo. Trazia uma
armadura refulgente, uma pena de águia flutuante no capacete e longos cabelos
caiam-lhe sobre os ombros.
Belo, mais belo que todos quantos o
haviam precedido, o olhar era orgulhoso a atitude imponente. A duquesinha, ao
vê-lo, sentiu uma sensação estranha que jamais havia experimentado. Quando lhe
anunciaram que estava disposto a escalar a montanha, estremeceu, quis demovê-lo
daquele propósito, e jurou-lhe fidelidade eterna.
O cavalheiro quis, porém, inabalavelmente,
tentar a ascensão. Pôs-se a caminho, transpôs os afrontosos trilhos e os
rochedos a pique. Leona seguia-o ansiosa com olhar, e contando cada um dos
passos do animal, e cada um dos perigos que passavam.
Quando o viu transpor com
facilidade os obstáculos, conservar-se de pé no declive mais escarpado, seu
coração bateu precipite, e ergueu os olhos para o Céu. Rezou, esperou, mas logo
voltaram novamente as angústias.
Entretanto, o cavalheiro prosseguia
a ascensão, subindo de rocha em rocha. De repente, parou. Tinha chegado ao cume
da montanha, e o seu penacho flutuava acima do abismo.
Perante esse espetáculo, a
duquesinha caiu de joelhos e a multidão, delirante de alegria, rompeu em
aplausos estrepitosos.
Depois a moça levantou-se, e veio
radiante ao encontro do estrangeiro.
Ele, porém, repeliu-a
desdenhosamente, dizendo:
— Vai-te para longe de mim, mulher miserável,
que tantas lágrimas fizeste derramar! Lembras-te dos nobres cavalheiros a quem
causaste a morte? Lembras-te desses três irmãos, que sem piedade viste perecer,
um, após outro? Vim para vingá-los. Queres desposar-me, e eu te maldigo.
A essas palavras, afastou-se, e a
desgraçada Leona ficou entregue aos seus pesares, e torturada pelos remorsos.
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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.
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