5/05/2025

O diabo e o ferreiro (Conto), de Figueiredo Pimentel


O DIABO E O FERREIRO

Passeavam, um dia, pela terra, Jesus Cristo, e São Pedro, cada um montado no seu burrinho, e chegaram a uma ferraria situada à beira do caminho.

Nosso Senhor aproveitou para mandar ferrar o animal; e, tendo gostado do trabalho do ferreiro, dando-se a conhecer, disse:

— Não te dou dinheiro, bom homem, mas prometo satisfazer a três pedidos que formulares. Dize lá o que desejas...

— Pede-lhe o Reino do Céu, ferreiro... — segredou-lhe São Pedro.

— Eu não! — retorquiu o ferreiro. — O Reino do Céu não me enche barriga. E voltando-se para Jesus: — Quero que toda a pessoa que se sentar neste banco se não possa levantar sem minha ordem.

— Concedo!... Qual é a segunda?  

— Pede o Reino do Céu, ferreiro!... — tornou São Pedro.

— Não me aborreça homem! — disse o ferreiro. — Depois de morto, tanto me faz ir para o Céu como para o Inferno.

Dirigiu-se a Nosso Senhor:

— Quero que todo aquele que subir nesta figueira, dela não possa sair sem o meu consentimento.

— Concedo!... Qual é a última coisa que desejas? —

— Pede o Reino do Céu, ferreiro!.... — tornou-lhe São Pedro, pela terceira vez.

— Que cacete! — exclamou o ferreiro. — Já lhe disse que não preciso do Céu para nada... Quero que todo aquele que entrar dentro deste saco de couro, dele não possa sair sem que eu o permita.

— Concedo — disse Jesus Cristo, montando no burrinho e partindo acompanhado de São Pedro.

Quando Nosso Senhor desapareceu, o ferreiro posse a refletir no que lhe havia sucedido.

— Ora, Senhor!! — dizia ele com os seus botões — fui um grande tolo!!... Para que servem os desejos que manifestei, quando podia pedir dinheiro e ser fabulosamente rico?! Também, se o diabo me aparecesse agora, era capaz de lhe vender a minha alma!

Pronunciando essas palavras, sentiu um grande cheiro de enxofre, e Satanás apareceu-lhe, vestido elegantemente, mas deixando ver os seus pés de cabra.

— Eis-me aqui, ferreiro. Estou pronto a fazer o negócio que desejas. Serás fabulosamente rico, mas daqui a dez anos virei buscar-te.

E desapareceu como tinha vindo.

***

Durante dez anos aquele prazo, Satanás apareceu. O ferreiro, que já tinha imaginado o meio de o enganar, disse-lhe:

— Pois não! O prometido é decido. Espera um pouco sentado neste banquinho, enquanto vou preparar-me.

O diabo sentou-se; mas passado algum tempo, vendo que a sua vítima não vinha, quis levantar-se. Debalde! Gritou, esbravejou, mas não o conseguiu.

Então apareceu o ferreiro:

— Não te poderás erguer sem o meu consentimento, e eu não to darei enquanto não me prometeres que prorrogarás o prazo por outros dez anos.

Satanás, querendo ver-se solto, acedeu.

Passado esse tempo, voltou, e o ferreiro usando das mesmas astúcias, fê-lo subir à figueira do inferno, donde não conseguiu descer senão depois de combinar que esperaria outros dez anos.

Pela terceira vez o diabo voltou. Entrando no saco de couro, o ferreiro meteu-o na bigorna, e começou a malhá-lo, até que o desligou da palavra dada, e despediu-se para nunca mais voltar.

***

Tempos depois o ferreiro morreu e foi bater à porta do Céu. São Pedro veio abri-la, e reconhecendo-o, negou-lhe a entrada.

Em vista disso, foi ele para o inferno, mas o diabo, também se recusou a recebê-lo, receando novas traições.

Desde esse dia, a alma do ferreiro vaga errante pelo espaço.



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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.

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