Outrora os habitantes de Gmund, na
Suábia, construíram uma magnífica igreja sob a invocação de Santa Cecília — a
padroeira dos músicos.
Lírios de prata brilhavam como
raios de luar em torno da santa: rosas de ouro, como a púrpura da aurora,
enfeitavam o altar.
Trajava a Santa um vestido de prata
e calçava riquíssimos sapatos de ouro, porque, naquele tempo, não somente na
Alemanha, mas no mundo inteiro, os ourives de Gmund eram celebres pelo seu
trabalho.
Grande quantidade de peregrinos
dirigiam-se à capela de Santa Cecília, onde constantemente ressoavam hinos
melodiosos.
Um dia chegou à cidade um pobre
tocador de violino, de faces pálidas e cavadas, muito magro.
Caminhara durante longo tempo,
estava fatigado, e não tinha mais nem um pedaço de pão, nem a mais pequenina
moeda de cobre.
Entrou na igreja, e tocou o seu
divino instrumento.
A Santa comoveu-se com aquela
melodia e comoveu-se com a sua miséria.
Fez um movimento, inclinou-se,
descalçou um dos sapatinhos de ouro e lançou-o nas mãos do pobre menestrel.
Louco de alegria, o mocinho saiu
correndo, a cantar, para fora da igreja, e dirigiu-se a um ourives, para
vendê-lo.
O ourives, apenas viu o sapato,
reconheceu-o, e fez prender o jovem músico, como ladrão.
Conduziram-no ao juiz, foi julgado
e condenado à morte.
Ressoou o sino funebremente,
tangendo pelos que vão morrer. Numeroso cortejo pôs-se em marcha. Ouvia-se o
canto solene dos monges, e dominando-os, os sons do violino, porque o inocente
músico pedira, como graça especial, para conservar o instrumento e tocá-lo até
o último momento.
Quando chegou diante da igreja de
Santa Cecília, rogou:
— Deixem-me entrar aqui, pela
última vez, e executar a minha derradeira harmonia.
Como a vontade dos que vão morrer é
sagrada, permitiram-lhe.
Entrou, prostrou-se, diante do
altar, e com mão trêmula, vibrou o arco.
A Santa comovida pela sua dor,
inclinou-se, descalçou o outro sapatinho de ouro, e lançou-o nas mãos do pobre
músico.
Numerosa multidão assistiu a esse
milagre, e todos viram como a Santa protegia os músicos do povo.
Cercaram o artista ambulante,
coroaram-no de flores, conduziram-no em triunfo ao palácio da Justiça, onde os
magistrados lhe ofereceram lauto banquete.
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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.
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