5/03/2025

O tocador de violino (Conto), de Figueiredo Pimentel


O TOCADOR DE VIOLINO

Outrora os habitantes de Gmund, na Suábia, construíram uma magnífica igreja sob a invocação de Santa Cecília — a padroeira dos músicos.

Lírios de prata brilhavam como raios de luar em torno da santa: rosas de ouro, como a púrpura da aurora, enfeitavam o altar.

Trajava a Santa um vestido de prata e calçava riquíssimos sapatos de ouro, porque, naquele tempo, não somente na Alemanha, mas no mundo inteiro, os ourives de Gmund eram celebres pelo seu trabalho.

Grande quantidade de peregrinos dirigiam-se à capela de Santa Cecília, onde constantemente ressoavam hinos melodiosos.

Um dia chegou à cidade um pobre tocador de violino, de faces pálidas e cavadas, muito magro.

Caminhara durante longo tempo, estava fatigado, e não tinha mais nem um pedaço de pão, nem a mais pequenina moeda de cobre.

Entrou na igreja, e tocou o seu divino instrumento.

A Santa comoveu-se com aquela melodia e comoveu-se com a sua miséria.

Fez um movimento, inclinou-se, descalçou um dos sapatinhos de ouro e lançou-o nas mãos do pobre menestrel.

Louco de alegria, o mocinho saiu correndo, a cantar, para fora da igreja, e dirigiu-se a um ourives, para vendê-lo.

O ourives, apenas viu o sapato, reconheceu-o, e fez prender o jovem músico, como ladrão.

Conduziram-no ao juiz, foi julgado e condenado à morte.

Ressoou o sino funebremente, tangendo pelos que vão morrer. Numeroso cortejo pôs-se em marcha. Ouvia-se o canto solene dos monges, e dominando-os, os sons do violino, porque o inocente músico pedira, como graça especial, para conservar o instrumento e tocá-lo até o último momento.

Quando chegou diante da igreja de Santa Cecília, rogou:

— Deixem-me entrar aqui, pela última vez, e executar a minha derradeira harmonia.

Como a vontade dos que vão morrer é sagrada, permitiram-lhe.

Entrou, prostrou-se, diante do altar, e com mão trêmula, vibrou o arco.

A Santa comovida pela sua dor, inclinou-se, descalçou o outro sapatinho de ouro, e lançou-o nas mãos do pobre músico.

Numerosa multidão assistiu a esse milagre, e todos viram como a Santa protegia os músicos do povo.

Cercaram o artista ambulante, coroaram-no de flores, conduziram-no em triunfo ao palácio da Justiça, onde os magistrados lhe ofereceram lauto banquete.

 

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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.

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