5/03/2025

Os dois caminhos (Conto), de Figueiredo Pimentel


OS DOIS CAMINHOS

Tomás — o bom mestre-escola da aldeia, uma ocasião achava-se em aula com os discípulos, que se compraziam em escutá-lo, porque as suas lições eram ao mesmo tempo agradáveis e instrutivas.

Nesse dia entretinha-os falando sobre a boa e a má consciência e as vozes secretas do coração.

Quando acabou, disse:

— Qual de vós poderia fazer-me uma comparação justa sobre o que acabo de explicar?

Um dos discípulos ergueu-se, e falou:

— Parece-me que posso, mas não sei se será justa.

— Vejamos, meu filho — replicou com bondade.

O rapazinho exprimiu-se nos seguintes termos:

— Comparo a paz da boa consciência e o desassossego de espírito, ao caminho que segui, em duas ocasiões diferentes. Quando os soldados inimigos passaram por aqui pela nossa aldeia, apoderaram-se violentamente de papai, e levaram-no. Mamãe chorava e desolava-se, e nós também chorávamos. Ela enviou-me à cidade, para saber notícias. Não o encontrei, e regressei como o coração aflito e amargurado. Foi por uma noite fria de inverno. O vento gemia, perpassando por entre as elevadas franças dos altos pinheiros. Eu vinha pensando que talvez nunca mais tornasse a ver meu bom pai, e não sabia como anunciar a mamãe o triste resultado da viagem. Essa noite escuríssima e tenebrosa causava-me grande pavor, e o ruído das folhas secas, levadas em turbilhão pela ventania, fazia-me estremecer. Imaginava comigo mesmo que assim deve sofrer um homem que tem uma consciência má.

— Menino! — exclamou o professor. — Alguém de vós quereria, no meio de uma noite assim terrível, ir procurar seu pai, não encontrá-lo, e escutar vozes das bestas feras, casadas às vozes do temporal?!

— Oh! não, não! — balbuciavam os alunos com arrepio de medo.

O jovem discípulo prosseguiu:

— Outra vez eu seguia o mesmo caminho, com minha irmã. Voltávamos da cidade e trazíamos muitos presentes bonitos, para fornecermos à mamãe, no dia de seus anos. Era por uma belíssima noite de primavera. O céu estava sereno e claro. Fazia um luar esplendido. Por toda a parte reinava a mais absoluta calma. No silêncio dessa noite formosa e serena, escutava-se apenas o murmúrio do regato, serpenteando à beira do caminho, e o canto do rouxinol trinando na mata. Eu e minha irmã caminhávamos tão contentes, que não podíamos falar. O nosso querido pai veio ao nosso encontro, e eu pensei: Deve gozar essas mesmas sensações o homem que tem uma boa consciência.

— São justas e muito próprias ambas as tuas comparações, meu filho! — disse o professor.



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Iba Mendes Editor Digital. São Paulo, 2025.

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