Alienação cidadã
“70% de cidadãos votam do mesmo modo que respiram: sem saber por que nem o quê. Votam como vão à festa da Penha - por divertimento. A Constituição é para eles uma coisa inteiramente desconhecida. Estão prontos para tudo: uma revolução ou um golpe de Estado. ”
Machado
de Assis,
em uma crônica de 15/08/1876
Cento
e quarenta anos se passaram desde a crônica de Machado de Assis, e ao que se
pode constatar a coisa se inverteu para pior. Hoje é possível afirmar que 70%
de cidadãos sabem exatamente porque votam, e aí reside o terrível drama. Votam
por questão de consciência, para mudar o Brasil, para tornar mais justa a
condição social da nação, para melhorar a segurança, a saúde e a educação... Muitos são capazes de citar parágrafos
inteiros da Constituição, e até cospem cidadania pelas redes sociais. Acreditam
piamente que a situação do país pode ser transformada através do voto. Nas
páginas dos jornais, cientistas políticos enfatizam a importância do sufrágio
universal. Na televisão e na Internet as propagandas buscam estimular o cidadão
a votar consciente e com responsabilidade: “Voto
não tem preço, tem consequência”. / “Seu
voto, nosso futuro”. / “Nesta máquina
você pode escolher o seu destino”. / “Seu
voto pode mudar a história” etc. Enquanto isso os políticos tiram ouro do
nariz e riem até cuspir o fígado de toda essa estúpida cidadania.
Desde
1989 que o povo escolhe o presidente da República por meio do voto direto. São
mais de 20 anos de pleno exercício da cidadania: 1989, 1994, 1998, 2002, 2006,
2010, 2014.... Quais foram, enfim, os resultados de tantos votos conscientes ao
longo de todas essas décadas? O que exatamente mudou no Brasil em todo esse tempo? Houve
redução da violência? Tivemos melhorias na saúde? A nossa educação atingiu o
nível da dignidade? A corrupção foi minimamente controlada?
A
resposta é um escandaloso NÃO!
Então
por que, afinal, insistimos nesta mesma tolice de que o voto pode mudar alguma
coisa neste país? O que realmente move uma pessoa com
certo nível de consciência da realidade a se perseverar em tamanha fraude? O que de fato leva alguém a se sentir realizado votando numa instituição política concebida
por políticos em benefício exclusivo da própria política? Como é possível que um cidadão íntegro
e moralmente consciente não se sinta envergonhado em contribuir para a manutenção
de um sistema tão propenso à corrupção como este?
Em
partes isso pode ser explicado pelo simples viés da esperança: pela vontade de
ver a nação transformada, pelo desejo de viver num país socialmente mais justo,
pela expectativa de que o candidato honesto faça a diferença etc. A realidade, porém, é que fomos histórica e inconscientemente
manipulados. Contaram uma mentira para nós, repetiram-na tão exaustivamente e com
tão virtuosos enfeites que até achamos um absurdo duvidar do poder do voto.
Isso
é simplesmente tudo o que eles querem!
Os
nossos votos é o que mantêm suas boas vidas; é o que assegura o estudo do filho
na Europa ou a viagem da amante aos Estados Unidos; é o que lhes dão sítios em
Atibaia, tríplices em Guarujá e confortáveis viagens em jatinhos executivos,
helicópteros, monomotores e ultraleves; é o que os fazem usufruir de uma
aposentadoria precoce e de tantos outros privilégios, tais como nomeações de
amigos, imunidade parlamentar, verbas de gabinete, cotas para serviços
diversos, auxílio-moradia, carga horária reduzida, carros de luxo, hotéis e restaurantes
5 estrelas; é, enfim, com os nossos votos que eles se perpetuam no poder
como hidras genealógicas, sem Hércules que as destruam.
Mas,
o que afinal se pode fazer para tentar mudar esta caótica realidade?
É
preciso ressaltar que o problema não reside na política em si, mas na forma
como ela se efetua no Brasil. Com leis tão brandas para os políticos, com uma
organização partidária parasita e com um sistema eleitoral autoritário, não se
pode vislumbrar luz no fim do túnel. O voto nulo é o passo inicial para fazer despertar na classe política algum
interesse por mudanças. Ele nos servirá como uma forma de boicote a este
sistema podre e devasso, que se mostrou ao longo dos anos num porto seguro dos
corruptos.
É
isso!
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Por: Iba Mendes (Agosto, 2016)
Por: Iba Mendes (Agosto, 2016)
https://www.youtube.com/watch?v=GRPSQJSvQaQ&t=6716s
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