7/16/2019

Guadalajara (Memória), de Ronald de Carvalho



Guadalajara

Coberta ainda pelos nevoeiros pardos da manhã, Guadalajara, pintada de azul e branco, parece uma talavera. Dentre a cortina dos plátanos imóveis e dos eucaliptos parados no ar, sobem, cortando de chofre a claridade prateada e fina, as torres pontiagudas da catedral. Rompendo a penumbra das folhagens pulam, de trecho a trecho, as curvas macias das cúpulas forradas de azulejos. O espaço é uma inquietação de pedras que se arremessam tragicamente para o céu.

Essa madrugada colonial é uma lição permanente da história do novo mundo. O ambiente da América absorve, nas suas solidões verdes e ásperas, os vestígios do homem europeu. A paisagem índia contraria o desenho espanhol. A rendilha churrigueresca dilui-se na atmosfera virgem das arvores mexicanas. E, quando o sol tapatio, abrindo toda a sua luminosa corola, arde no firmamento, Guadalajara fagulha em tons violentos e agressivos. O zarape de Saltilho ou de Caxaca vence, nas suas geométricas coloridas, o misticismo castelhano. O índio levanta-se, mais uma vez, nesse primeiro minuto de aurora, para repelir o conquistador.


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Pesquisa e adequação ortográfica: Iba Mendes (2019)

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